Não entendo bem ou melhor, não sou muito chegado ao "Rap", exceto quando o assunto é a letra que, normalmente, fala dos problemas do povo. Para os devidos efeitos sou sempre da seguinte opinião: “quando não entende alguma coisa, passe a admirá-la”.
Agora surgiu uma canção que está a render muito em conversas de rua e também aos especialistas em crítica. A bola da vez é a canção de Yannick Ngombo, o Afroman, que é o “rapper” do momento em Angola. Curta a letra e depois tire suas conclusões.
«Se queremos mudar, esse é o tempo/porque ainda vai a tempo»
Yannick Ngombo (Angola)
Glossário
Mangolés – angolanos
Tuga – Portugal
Mundele – branco
Mbumbo – negro
bué - muitos
Não sei como é na tua banda
Mas aqui uma empresa quando tem muitos claros, é porque paga bem
Se tiver bué de negros, podes crer que o salário não convém
Há sítios onde o negro é barrado
Mesmo bem apresentado
Mas o branco pode entrar de chinelas, calção, parte os cornos ou de fato-macaco
Você até fica fraco
Não é preciso ir na Alemanha, Brasil ou em Portugal
Em Angola o negro discrimina negro igual
Nenhum branco quer ser negro
Mas a maioria dos negros querem ser brancos, seus parvos
Utilizam produtos que nem o Charles Buá
Fritam o cabelo igualzinho ao Akwá
Um negro com lentes de contacto fica tipo um cambuá
Como é que não vos chamam de macacos, uá
Mesmo aqueles brancos que lá não são ninguém
Aqui são todos chefes, uma vida se bem, um salário que arromba
Quantos mangolés estão na Tuga a sofrer na obra?
Preto macaco, toma banana
Ainda são discriminados
Mundele pode fazer 20 anos na
África, não muda seu sotaque hábitos e costumes
Tira o chapéu
Mas o mbumbo um ano só nas bandas já se dá de europeu
Até vem te dizer preto mesmo é atrasado, é muito preconceito
Em Angola só não temos preconceito na bebida e no sexo
Bum bum bum, estou a abrir ché um pula por aqui
Terá perdido qualquer coisa?
«Não, esta casa pertence-me, vim recuperá-la»
Brinca bem que tantos anos a viver aqui
Ou me mata ou quê, não saio daqui
Nem com um contra-fé,
Fugiram da guerra
Agora estão a vir como donos da terra
«Não sou culpada pá, eu não tenho nada a ver com os vossos problemas»
Só falta vir mais um mundele com um papel dizer que o país é dele, isso é racismo
Refrão (2 vezes):
Eu não sou racista, sou realista
Mangolê precisa de uma lição de moral
Para se libertar de uma escravidão mental
Não sei como é que é ali, mas aqui meu dom
O mais lixado não é o pula, é o latom
Eu sou latom minha namorada era black
Eu não tenho nada a ver com essas dicas
Vieram da mistura mas com negro não querem se misturar sempre a discriminar
Feio ancorado com matumbo se casam entre eles
Mas se for um mbumbo, tem que ser um daqueles
Ou é falado ou tem nota verde
Dizem o mulato não se perde é mentira nós é que fizemos assunto deles
Não admira, o nosso complexo é que lhes deu acesso
O negro quando agarra uma mulata
Ua ué, só da maneira que estranha
Se for uma branca, tipo que já está no céu, homem aranha
Há sítios onde você entra, funcionários são todos clarinhos
Negros só um ou dois, essa história não é de hoje
Não é preciso ser bom ou ter dom
Em Angola, é mais fácil encontrar um emprego se fores branco ou latom
«Estou andar muito no sol até estou a ficar escuro possa»
Se preocupamos muito com, a cor, isso não é uma questão política
O próprio negro é que não se dá valor
Há negros que fazem filhos mestiços pensando no seguinte:
A cor deles como é que dá sorte, quem sabe um dia vai ajudar a família
É difícil ver um latom que tem massa a casar com uma dama pobre da minha raça
Ou a negra tem ou é fi lha do fulano
Pode ser engano, mas a maioria
das filhas ou filhos dos negros que têm dinheiro
Casam-se mais com pulas ou latons
Essa história já vem de longe
O mais agravante é que negro quando já está a ter um pouco de fama ou dinheiro só mulata é que é mulher
Le leva daqui dali a se exibir para toda gente le ver
Ché está com uma latona
Há negras que só garinam com pulas
E há negros que falam mesmo assim
«Eu gosto de mulatas»
«É, que eu gosto dele» amor não tem
cor isso é complexo da pele acredita
Por isso hoje muitos latons dizem a
nossa cor facilita
Refrão (2 vezes):
Eu não sou racista, sou realista
Mangolê precisa de uma lição de moral
Para se libertar de uma escravidão Mental
Há quem quando lhe dizem estás a ficar bem escuro só o desgosto no rosto
Agora lhe diz o contrário: estás ficar bem clarinha
«Ai obrigado, muito obrigado»
Só a alegria
Eu nunca tive o pesadelo, melhor dizer, sonho de ser branco ou amarelo
Olhem para mim, úau, olhem para mim, úau
Como adoro a minha pele de cacau
Na maior eu digo isso
Cabeça erguida, o melhor presente que Deus me deu na vida foi de me ter feito escuro Afroman puro
Moreno, cabrito, evita isso, meu irmão
Mestiços são negros em toda parte do mundo
Só em Angola é que não são
Negro ou branco, nenhuma raça é superior ou inferior
Somos todos iguais
Só há diferença na cultura e na cor
Desculpa se eu feri a sensibilidade ou passei a meta
Só sei que isso dói
A verdade dói, mas constrói
Podes até me chamar teta, pateta ou careta
Mas uma coisa é certa
A nossa sociedade precisa de uma
mudança de mentalidade
Eu não sou racista, sou realista
Eu sei que o angolano tem problema de interpretação
Por isso atenção, eu não tenho nada contra latons ou pulas
Digo isso no fundo do coração
Eles não se dão de superiores, nós é que nos sentimos inferiores
Nós é que temos que eliminar esse complexo, fazer uma revolução mental
Para que no futuro os nossos filhos possam viver de igual para igual
Sem preconceito racial
Senão, os nossos netos viverão numa nova era colonial, por culpa de nós próprios
Se queremos mudar, esse é o tempo
Porque ainda vai a tempo
Ref.: SA
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