Projetos como esse, com certeza, minimizam os problemas dos angolanos em vários domínios. Hoje, Angola investe rios e rios de dinheiro para formar angolanos fora do país. A idéia é até muito boa, mas os resultados deixam a desejar. Os nossos compatriotas, normalmente, encontram, nesses países, sistemas de educação completamente diferentes, mais apurados, mais sérios, mais eficientes e sem corrupção. Fora, não se faz a caixinha de natal ao professor. O nome do pai, nem interessa. Então, os filhos da Nzinga Mbandi ficam patinando o curso todo. Isso é problema nosso. Não acontece, por exemplo, com estudantes senegaleses, gaboneses e camaroneses. Ou eles têm um bom sistema de ensino ou um bom sistema de seleção ou então ambos.
No caso específico de alunos ao Brasil, aqueles que são encaminhados para as Universidades Federais (Universidades públicas), que preparam profissionais com perfil de “cientistas”, mais desafiante, nossos irmãos têm enormes dificuldades de lá saírem formados. Cursos como engenharia, quando se formam, por exemplo, levam, em média, 10 anos. É muito tempo para ficar fora da família. Sofre o aluno, os amigos e "os amores", a família e até o país. Além disso, esse tempo é suficiente para que o indivíduo constitua família e fixar residência (fora), não retornando mais para Angola. São três prejuízos.
Um aspecto que precisa ser também salientado. O valor das bolsas de estudo, para certos casos, é superior aos salários de professores universitários. Dessa maneira, seria mais econômico contratar 200 professores, no exterior, que podem beneficiar a mais de 2 mil angolanos. Se compararmos os valores de bolsas que países como São Tomé e Príncipe ou Guiné Bissau conferem a seus estudantes, em relação aos nossos, a diferença é abismal. Ironicamente, estudantes que recebem pouco dinheiro têm pouca diversão, a bolsa não atrasa e estudam mais e se formam mais rápido. Para confirmar os altos soldos dos angolanos, basta participar de uma festa. O angolano é facilmente identificado. Quase sempre, com aquele ar de superioridade, roupas de marcas caríssimas, fala alto, nunca se sabe se se trata de conversa, olimpíada de gritos ou de uma sessão de exorcismo, e festas que varrem a noite toda. Resquícios dos velhos tempos de “recolher obrigatório”.
Ainda, devido às falhas do nosso ensino de base, um outro fenômeno que normalmente é registrado é a dança de cursos, bem no rítmo da kizomba. Estudantes muitas vezes sem estratégias de estudo. Começam fazendo Engenharia. Ficam 3 anos cursando cadeiras do primeiro ano. Depois de algum tempo transferem-se para Administração. Em seguida, Filosofia e, finalmente, acabam fazendo Letras; isso quando não fazem curso superior de curta duração (dois anos) destinado a público específico ou então se transferem de Universidades Federais para Universidades particulares. As Universidades particulares, normalmente, têm foco no mercado de trabalho. Outros sem muito escrúpulo, fazem cursos técnicos e voltam se passando por técnicos superiores. Os sem vergonhas ficam 8 anos fazendo o curso, não são aprovados nas cadeiras do segundo ou terceiro ano, voltam e chegando em Angola exigem que os outros lhes chamem de "doutores".
Recentemente, o que tem mais atormentado os estudantes são jubilações por força de regimento de estudante de convênio. Se o estudante “chumbar” duas vezes, em vez de três, na mesma cadeira (disciplina) é extirpado da Universidade. Dançar duas vezes numa cadeira, para ciências exatas, é quase uma regra. Isso tem acontecido muito, infelizmente. Não podemos jogar a culpa somente nos estudantes. É tudo estrutural. Indivíduo aceita fazer engenharia ou Economia ou sei lá alguns cursos, só por uma questão de prestígio social ou porque a família quer, sem nenhuma base de Matemática, Física nem Química, aí fica difícil. Outros, no entanto, são enviados e esquecidos nesses locais. São depositados e espera-se que rendam juros. Isso pode ser agravado com os crônicos atrasos de bolsas que chegam até 6 meses (saudade do INABE). Dificilmente recebem visita de um “mais velho” para conhecer seus problemas in loco, mesmo que não os resolva. Só uma visita já elevaria o moral dos estudantes, como fez Bush quando visitou o Iraque, por exemplo.
O problema não termina aí. Com toda essa odisséia, para aqueles que com muita luta conseguem terminar e imbuídos de espírito patriótico resolvem regressar, a passagem de regeresso leva 5 meses para chegar e, quando chegam em Angola, com freqüência não conseguem colocações. Quando conseguem, normalmente como professores, se defrontam com estruturas ultrapassadas, com pessoas avessas às mudanças. Muitos deles limitam-se a exercer, principalmente em multinacionais, atividades rotineiras, ou seja, office-boy de luxo, um salário infinitamente inferior aos de seus colegas estrangeiros. Chefia, nem pensar. Muitos frustam-se e se transformam em bêbados incorrigíveis. Quem está do outro lado (de cá), e informado disso, pensa uma ou duas vezes antes de se formar. Por isso, muitos alunos chegam a reprovar numa cadeira do último ano, uma ou até quantas forem possíveis só para adiarem a sua formatura e consequentemente o regresso. É verdade que não são todos que fazem isso. Justiça seja feita. Temos jovens de valor que fazem bem a lição de casa. O problema é que são poucos. Isso acontece mais com aqueles que possuem bolsas de empresas petrolíferas.
As novidades dos últimos anos são empresas petrolíferas que fazem contratações a partir do exterior. A princípio é uma boa idéia. Todos os domingos, em qualquer jornal de circulação nacional, lá está o anúncio "Trabalho em Angola: precisa-se de Engenheiros, Administradores etc.". Os currículos são enviados para lá. Os testes acontecem, mas nunca se sabe quantos são contratatos. Há empresas que possuem fichas até um pouco estranhas. A primeira pergunta que aparece é se o candidato possui um familiar no governo, quem e qual o número de telefone. Quer relação existe entre a capacidade intelectual com o parentesco? Alguma injustiça pode ocorrer: deixar de contratar alguém capacitada mas que é parente de alguém do governo ou o contrário. As empresas deveriam seguir leis angolanas quando operam em Angola, porque quando o assunto é democracia, a lei de fora também não funciona em Angola.
Para acabar com muitas injustiças, o país ganharia muito, se investisse mais na graduação, mas em Angola, e enviar ao exterior pessoas de bom desempenho acadêmico para fazer a pós-graduação, nomeadamente, especialização, mestrado e Doutorado ou pós-doutorado. Normalmente o tempo é curto, um, dois ou quatro anos. Nessa fase as pessoas são mais maduras, via de regra, com famílias constituídas. Não teriam interesse em ficar indefinidamente no exterior. Um outro aspecto positivo: dificilmente um aluno de pós-graduação se mete em farras, diferentemente de gerações mais novas, os kuduristas. Aproveitariam melhor as bibliotecas.
Todos ganhariam. A burguesia, com bolsa ou sem bolsa, continuaria enviando seus filhos para fazer graduação fora, principalmente na modalidade segundo a qual o governo faz acordos com universidades de fora e estudantes são enviados com vaga garantida, só que a manutenção é por conta da família. Assim, o angolano da classe “z” teria acesso a esse bem precioso no país e a nação também ganharia porque geraria um saber “angolano” e ainda o INABE seria poupado daquelas injúrias que com frequência ocorrem.
Um aspecto sádico do atual sistema é que o acesso a essas bolsas não é aberto a todos. Aliás, pode até ser aberto, mas vários são os fatores que fazem com que apenas as mesmas famílias, a mesma casta, as usufruam, ou seja, atende, quase sempre, a uma classe privilegiada.
Ainda sobre o saber angolano, nós precisamos desenvolver, por exemplo, uma engenharia genuinamente angolana. Uma engenharia que busque soluções, que erga o setor produtivo e encontre caminhos que melhorem a qualidade de vida da sociedade angolana. Para que o país cresça, precisamos investir na produção de uma reserva adequada de mão de obra graduada com alta qualificação e certificação. Investir também em mão-de-obra técnica competente para atrair interesse de multinacionais.
Foto: UFPR
Publicado no Portal Club-k.net
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Por Educar
2 comentários:
Dr cangue ou Kota cangue como preferir
sou um dos que le os seus artigo no club-k e as vez que sao muitas passo por ca sem esperar o update no meu e-mail para ver o que de novo tem no seu blog. sinceiramente tenho gostado dos seus artigo, so cria fazer-lhe uma pergunta que espero tenha tempo para a responder. teria o kota Cangue disposto a ariscar a sua vida professional para se envolver num projecto como este? e que sedo estaria a concluir a minha formacao e tenho pensado se vale apena ir trabalhar em angola ou ficar por ca. espero a sua resposta lica1@webmail.co.za
Dr cangue ou Kota cangue como preferir
sou um dos que le os seus artigo no club-k e as vez que sao muitas passo por ca sem esperar o update no meu e-mail para ver o que de novo tem no seu blog. sinceiramente tenho gostado dos seus artigo, so cria fazer-lhe uma pergunta que espero tenha tempo para a responder. teria o kota Cangue disposto a ariscar a sua vida professional para se envolver num projecto como este? e que sedo estaria a concluir a minha formacao e tenho pensado se vale apena ir trabalhar em angola ou ficar por ca. espero a sua resposta lica1@webmail.co.za
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