sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

Perdão aos políticos corruptos angolanos antes das eleições

"Ou devolvem o dinheiro ou investem-no em Angola"

Há poucos dias li a uma “entrevista” feita por Paulina Frazão (PF) a Celso Malavoloneke (CM) publicada no portal club-k.net. Duas perguntas chamaram-me atenção e as reproduzo a seguir:
(PF) Dizer que a primeira dama (Ana Paula dos Santos), em menos de 10 anos, tornou-se milionária é crime?
CM: Não, ela é figura pública, mas tem direito ao bom nome. Caso seja verdade e o possas provar, estarás até prestando um serviço a nação.

(PF): Dizer que a primeira dama de Angola co
mprou mansão nos Estados Unidos com dinheiro do erário é crime?
CM: Não. Caso o possas provar em queixa à PGR (Procuradoria Geral da República). Seria até um serviço à Nação. Por que não tentas, como fez o Rafael Marques, Aguiar dos Santos, e mais recentemente o Graça Campos (só que este acabou preso)? Apoios não faltarão, de certeza...

Quem iria apoiar uma ação dessa? Jornal de Angola? Provas? Não há como apresentar provas da corrupção. Na corrupção não se emite nota fiscal. As pessoas não se reúnem com a finalidade de constituir uma sociedade de corruptos e no final fazerem uma ata. Não se registra uma empresa de corrupção. Como provar que numa concorrência, uma determinada empresa foi beneficiada ou não, se ninguém tem acesso às propostas? Ninguém tem acesso a esses documentos. Como provar se não há transparência de contas públicas? Isso seria o mesmo se alguém quisesse saber se um indivíduo que cursou engenharia fez cábulas (cola) ou não.

No entanto, há uma forma indireta de provar. Eu ficaria muito desconfiado de um engenheiro que não soubesse, por exemplo, achar a raiz quadrada de trinta e seis. Ou então, não soubesse comparar dez por cento de cem com cem por cento de dez. Ou, poderíamos descobrir se um desgraçado juiz de Direito possui ou não sólida formação nesse campo ou fugiu da escola, pelas sentenças que profere.

Exercitemos um pouco nossas memórias. Em 1975, quando Angola tornou-se independente, tínhamos apenas uma meia dúzia de “insepocamues”, ou seja, indivíduos em situção confortável, razoalvelmente abastados que aspiravam à classe rica e até hoje continuam lutando. Não faziam parte dessa classe os ex-guerrilheiros, que durante muitos anos ficaram nas matas. Com a independência, esses comunas, que em 1975 desfilavam em carros abertos, naquelas entradas triunfais, que muito faz lembrar o desfile de Fidel Castro e seus companheiros pela cidade de Havana, hoje, tornaram-se os políticos da ocasião

Todos nós éramos miseráveis. Como prova disso, segundo uma entrevista publicada no portal club-k.net (10/01/2008), Maria Eugênia Neto, esposa do primeiro presidente angolano, que é militante acérrima, mas nunca se inscreveu no MPLA (por que será, hein?), conta as dificuldades que o médico Neto, que não deixou patrimônio aos filhos, passou.
O malogrado Agostinho Neto montou um simples consultório em Luanda. Ela, que não quer ter problemas se afirmar que o presidente em exercício José Eduardo dos Santos está muito tempo no poder prefere, portanto, ficar calada (o que diz muito), trabalhou como assistente do Manguxi. Viveram em casa de um cunhado até que arranjaram a deles. Notem as nossas origens. Quem foi maior que o Neto? Ninguém fica rico com salário oficial e muito menos de um dia para outro. O próprio Presidente do MPLA e da República em exercício certo dia reconheceu isso, quando afirmou “ninguém vive do salário”.

Num de seus artigos, Nelo de Carvalho tentou provar que o patrimônio do Presidente do MPLA pode ter provindo de economias do salário que ele percebeu durante três décadas. Vale lembrar que essa suposição considera que o presidente não gastou nada do seu bolso, ou seja, todos os seus gastos pessoais e da família saem do erário. (Se Lula ouvir isso, poderá sair candidato às eleições em Angola). O argumento até poderia convencer, se tivéssemos só um milionário.

Porém, (há sempre um porém) a prática mostra que, as pessoas mudam rapidamente de “status” tão logo são promovidas a cargos importantes. Eles não sabem nem ser discretos, mas também o indivíduo não se preparou para tal. no abir e fechar de olhos, eles o
btêm muitos carros de última geração. As esposas passam a fazer cabelos fora do país. Os seus filhos passam a estudar fora do país e, em muitos casos, com despesas pagas por grandes empresas. Empresas amigas. (Como essa empresa pode perder uma concorrência?). Muitos, de um dia para o outro, transformam-se em “empresários”. Outros, donos de poços de petróleos ou de bancos. Em poucos anos, aparecem nas listas de pessoas mais ricas da África ou do mundo. E depois eles dizem estão certos e os outros não sabem administrar o país ou representam uma ameaça!.

Por que esse “sucesso” só acontece com políticos? Há professores universitários ou até economistas, que trabalham, honestamente, a vida toda. No entanto, para conseguirem comprar uma viatura o fazem em prestações de até 5 anos, com enormes sacrifícios. A lei da prosperidade é semelhante à da gravaidade, é universal. Não sou contra o enriquecimento de pobres, mas há uma coincidência estranha.

Por que um honesto, com elevada escolaridade enriquece-se à custa de muitos esforços e por longo tempo, de árduo trabalho, enquanto os “analfabetos”, mas políticos, o fazem em tão pouco tempo? Se isso fosse regra, não precisaríamos mais estudar.

Há poucos anos um semanário apresentou a lista das 60 pessoas mais ricas de Angola. Dessa lista, quase 99 por cento são políticos e um ou dois empresários. Pode? Há “marcutaia” nisso, diria o presidente Lula.

Deixemos isso pra lá. Hoje estou escrevendo é para comentar o artigo que encontrei perdido na internet que propõe o perdão de todos os políticos corruptos, mas com algumas condições.

Angola se prepara para as segundas eleições, depois de fracassadas as primeiras de 1992. Para evitar o fracasso das segundas, chegou o momento de colocarmos tudo em pratos limpos. As igrejas chamariam isso de “cerimônia de santa ceia”. Um lava o pé do outro e depois se abraçam. Esquecer o passado e começar uma nova vida. Outros países chamariam de “pacto de governança”. Se isso não for feito poderemos ter problemas sérios.

Primeiro, quem estiver no poder, que se enriqueceu ilicitamente, fará tudo para se perpetuar no poder, com medo de que o seu sucessor lhe venha fazer vida cara. Nesse caso, não teria escrúpulo de fraudar as eleições, caluniar a oposição, ameaçar eleitores, criar instabilidade política, se for o caso, prometer roubar a lua só para iluminar o nosso país ou fazer o uso da máquina administrativa. Isso se daria com inaugurações maciça de obras, arrumar empregos para todo mundo, só para inchar a máquina administrativa, doar dinheiro às igrejas, aos sobas, distribuição de bolsas de estudos; doar pano e roupas em troca de votos. Seriam verdadeiros cordeiros de um dia para outro, um comboio de alegria. Para um povo tão carente e com baixa escolaridade, até um chup-chup seria suficiente. Talvez isso não acontecesse em Luanda.

Em seu artigo intitulado “A dinâmica das causas da expropriação do capital estatal, como condição indispensável para um perdão económico e financeiro em Angola” publicado no jornal “Folha de Angola”
(
http://www.folhadeangola.com/noticia.php?id=228), António Marcelo Domingos propõe o perdão econômico e financeiro, como parte indispensável do processo de paz e reconciliação, da mesma forma que ocorreu o perdão político e militar. Caso contrário, “os atuais dirigentes estarão sempre acorrentados, eternamente, na busca do poder a todo o custo à procura de imunidades que lhe permitam salvaguardarem os seus interesses pessoais, mesmo contra a sua própria vontade, o que é pior que a própria prisão”.

O engenheiro mineiro, economista e Mestre em Ciências Econômicas acredita que o desvio dos fundos públicos foi uma medida imposta. Dessa maneira, se não ocorrer o perdão, ficarão mutiladas as bases para uma verdadeira democracia, justiça e dignidade para os angolanos. Além disso – afirma ele - poderemos adiar o surgimento de uma nova mentalidade na gestão dos bens públicos e, consequentemente, adiar os índices de desenvolvimentos sociais e econômicos.

Voltando na questão de “provas da corrupção”, para mostrar como isso é difícil acontecer, o professor da Universidade Agostinho Neto afirma que, os meios mais comuns de desvios são: “dividir o petróleo no mar”. Isso consiste em dar outro destino dos recursos antes mesmo de serem contabilizados, ou seja, sem que cheguem aos cofres do Estado. Como apresentar provas disso? Os valores (o dinheiro) - continua o iluminado - são então repartidos entre os componentes da máfia. Isso é coisa de peixe grande. E o povo tem ficar engolindo a “mal-criadez” dos filhinhos de papai, que se exibindo de um lado para o outro, como se seus pais fossem super-heróis.

A proposta do perdão, segundo o professor António Domingos é também para tranqüilizar esses infelizes filhos porque senão “os herdeiros destes valores nunca terão paz espiritual, o pesadelo dos erros dos seus antecessores lhes perseguirá de geração à geração”

Ainda sobre a corrupção, outros meios também apontados são saídas fantasmas, maquiar as contas só para confundir a fiscalização. Há também dirigentes que criam empresas de fachadas, muitas vezes utilizando trabalhadores assalariados pelo Estado, doações internacionais que são desviadas para benefícios próprios, enfim. Essa situação tornou-se crítica com a mudança do sistema socialista para a “capitalista”. Isso desencadeou uma corrida, sem critérios, a tudo que durante muito tempo se combateu: ser burguês, empresário, exploração do homem pelo homem, enfim.

Em sua opinião, o mestre da Escola Superior de Ciências e Tecnologia da Lunda Sul, acredita que as grandes potências globais nunca se contentaram com o direito à livre escolha do povo angolano. A guerra teve uma grande contribuição na massificação dos desvios dos fundos públicos.

Senão vejamos. Imaginemos que uma cidade está à beira de ser ocupada, militarmente. O administrador, naturalmente, antes de sair em busca de segurança pessoal ou coletiva, se apropriava de uma soma possível, até para recomeçar a vida para o novo local. Os efeitos disso ainda permanecem até os nossos dias e, de diversas maneiras, mesmo já termos muitos quadros formados. Aliás, as "oportunidades de emprego são mais reais àqueles que aceitam as regras do jogo imposto, mesmo que isso signifique abdicar de valores éticos, morais, religiosos" etc.

Para pararmos com essa bola de neve, o professor entre as propostas que apresenta, com variantes, destaco: a devolução voluntária, consciente e honesta dos valores estatais em sua posse em troca de 10% do valor”. E se for um Anania e só devolver uma parte? Importante é que o todo dinheiro fosse investido no país, pelo menos. Isso movimentaria a economia e geraria novos e muitos postos de trabalho. A nova geração será capaz de colocar o país no trilho do desenvolvimento. Essa seria uma maneira de se recuperar o “zelo pela propriedade coletiva”. Dessa forma, “eles ganhariam respeito e a dignidade e transformar-se-á numa espécie de herói ao compartilhar a dor e o sofrimento de seu próximo de uma forma mais justa”.

Tudo porque em “cada milésimo de um centavo do capital estatal expropriado, não só carrega consigo a dor, o sofrimento, e o sangue de milhões de angolanos sacrificados, mas também ameaça crucificar outros a eterna miséria”.

Esse pequeno mas grande angolano nos convida a refletirmos um pouco. “Os nossos (deles) chuveiros e luxuosos carros, as nossas jóias a fragrância dos nossos perfumes, as nossas (deles) volumosas contas bancárias carregam consigo em cada pedaço, em cada centavo, uma lágrima de nudez, fome e a cumplicidade da negação, na falta de coragem de mudarmos, para criarmos honestamente um futuro melhor para os nossos concidadãos. E ninguém tem o direito de sentir-se dono de Angola”. A matéria desse ser humano em extinção
é enorme
. Recomendo o artigo com calma.

A maca é muito grande. Todo início é sempre difícil. É cheio de entropia, de confusão. É uma babilônia. Todos que sobreviveram até hoje precisam ser protegidos. Vamos nos perdoar e comecemos uma vida nova. Eu sou a favor de que Angola abra essa caixa preta e discuta, abertamente, o problema. Vamos fazer pactos. Somos todos irmãos. Vamos deixar tudo bem claro para que ninguém se sinta ameaçado. “O combinado não custa caro”. Caso contrário, ficaremos sempre na mesma mer.... merocele.

«Assinado por Feliciano J.R. Cangüe»

Na Foto acima, o professor M.Sc. António Marcelo Domingos
Publicado no Club-k.net (30/01/2008)

Um comentário:

  1. A idéia é boa. O problema é: quem vai reconhecer que é corrupto? Se houvesse humildade, de muitos virem a público e reconhcer que se apoderaram do dinhieor público ficaria fácil a aplicação disso. Esta semana o Kopelipa comprou uma fazenda no valor de 2 milhoes de dólares em portugal para fazer vinho. Poderia aplicar este dinheiro em Angola. Só vai enriquecer os portgueses

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