sábado, 24 de dezembro de 2011

Decisões judiciais encomendadas têm dias contados



Luz ao fundo do túnel

Três anos depois do bastonário da Ordem dos Advogados de Angola (OAA), Raul Araújo, ter denunciado publicamente que algumas decisões judiciais eram encomendadas, como resultado de uma espúria aliança entre juízes e advogados, nenhum jurista ou algum magistrado foi até à data apanhado e punido, por supostamente ter se envolvido em tais «esquemas».

A denúncia feita em meados de 2008 pelo causídico, embora tivesse causado um forte impacto nos meios judiciais, sobretudo entre os membros do Conselho Superior da Magistratura Judicial, parece ter caído num saco roto.

Além dos alegados casos de sentenças cozinhadas, tem estado a correr relatos de casos que envolvem determinadas figuras ligadas à Justiça, nos quais se destacam as práticas de abuso de autoridade ou de prisões arbitrárias.

Infelizmente, têm sido vários os casos de violação sistemática dos direitos dos cidadãos, sobretudo dos mais fracos, que não têm como denunciá-los ou, quando emergem à luz do dia, acabam por não produzir os efeitos esperados, por desistência dos lesados ou aparente inacção dos órgãos encarregues de exercer a acção disciplinar sobre os magistrados acusados de terem pisado o risco.

Embora o Conselho da Magistratura Judicial defenda publicamente que, no exercício das suas funções, os magistrados judiciais devem apenas obediência à lei e à sua consciência, o facto é que a prática nem sempre tem sido condizente com esta vontade expressa.

No universo de casos de desmandos e de actos de abuso de confiança, raros são aqueles que, depois de chegarem ao conhecimento dos órgãos afins, resultem em acções disciplinares contra os acusados.

Desde que foi institucionalizadohá pouco mais de uma década e meia quase não se tem memória de que algum juiz tenha sofrido uma «pesada sentença» que culminasse com a sua demissão, por actos de corrupção ou comportamento indecoroso.

O afastamento há alguns anos de um juiz afecto ao Tribunal do Namibe foi, no entender de alguns juristas, uma das poucas excepções à regra,em contraste com as múltiplas denúncias de casos graves de violação dos direitos dos cidadãos e de excessos de autoridades por parte dos magistrados, tanto os do Ministério Público, como os da Magistratura Judicial.

No entanto, uma luz ao fundo do túnel parece estar a emergir depois da recente medida tomada pelo Conselho Superior da Magistratura Judicial, que na semana passada decidiu suspender o juiz municipal do Huambo, Orlando Rodrigues de Lucas. Este magistrado era acusado de um alegado abuso de autoridade contra um dos administradores municipais daquela província e de exercício de actividade comercial ilícita, incompatível com a sua condição de juiz.

Trata-se de uma medida que alguns consideram inédita, já que ela determina um prazo, no caso concreto de dois meses, para que seja instaurado o respectivo processo disciplinar contra o referido magistrado judicial.

Consta que nunca esse órgão máximo da magistratura judicial havia fixado um prazo para a instauração e conclusão de um processo disciplinar.

Talvez por isso é que ganham alguma consistência os relatos de que alguns juízes que tinham sido suspensos pelo Conselho da Magistratura Judicial, depois de acusados da prática de actos de corrupção, abuso de autoridade ou por outros crimes não menos pesados, acabaram por ser «absorvidos», devido ao facto dos seus processos disciplinares terem prescrito.

Daí que o processo disciplinar instaurado contra o referido juiz esteja a causar uma certa expectativa, pelo que se abre uma boa oportunidade para que esse órgão judicial arrede as suspeitas de ter agido no passado no sentido de favorecer os acusados, no quadro de um suposto corporativismo existente no seio da classe.

Fonte: Semanário Aangolanse EDIÇÃO 447, SÁBADO • 24 de Dezembro de 2011

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