segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Um novo Império Romano

A Eni, uma empresa estatal petrolífera, que também opera em Angola, criada em 1953 com a finalidade de ajudar a Itália a se tornar independente de empresas estrangeiras, está crescendo.

No dia 23 de novembro, a Eni comprou uma parte de vários campos petrolíferos em Uganda de uma pequena firma de exploração. Em outubro, a empresa descobriu uma reserva em alto-mar na Venezuela e conseguiu a licença para desenvolver um campo petrolífero no Iraque. A Eni também já está atuando no Mar Cáspio. A empresa espera produzir até 2012 o equivalente a mais de 2,1 milhões de barris por dia. No ano passado, a produção era de 1,8 milhão.

Mesmo com uma dívida de mais de 40% de seu patrimônio líquido, as divisões de gás e energia deram mais lucro que a exploração e a produção no ano passado. O principal bem da Eni é a metade da Snam Rete Gás, que é a maior distribuidora de gás da Itália. Além disso, a empresa é dona da maior instalação de armazenamento e do gasoduto que traz gás para a Itália e o distribui pelo país.

Fonte: http://opiniaoenoticia.com.br/economia/negocios/um-novo-imperio-romano/?optin

sábado, 28 de novembro de 2009

Tolerância zero de quem contra quem? - Ismael Mateus


Por Ismael Mateus

Por ter decretado tolerância zero à corrupção e má governação, somos todos forçados a dar as boas vindas do presidente Eduardo dos Santos ao país real, da gasosa e do assalto ao bem público. Se não for tarde de mais, a tolerância zero será a primeira medida real, concreta, contra um mal que subjugou completamente as boas práticas governativas do país. Quando os jornais privados há 10/15 anos denunciaram o intenso descaminho dos bens públicos e o mau uso dos dinheiros públicos alguém entendeu chamá-los de pasquins, preferindo-se fortalecer o discurso da falta de provas ao invés de se obrigar as estruturas de investigação a cumprir o seu papel.

Quiseram fazer vingar uma cultura da delação, onde o queixoso é que tinha a obrigação de denunciar e de apresentar o ónus da prova, quando, na verdade, a denúncia pública deveria ser um ponto de partida para um trabalho de investigação de instituições como a Procuradoria da República ou o alta instancia contra a corrupção (nunca criada, apesar de aprovada em 1990).

A Assembleia Nacional e o Tribunal de Contas, ainda que fiscalizadores, não são suficientemente especializados na matéria para encetar um verdadeiro combate ao nível de corrupção e promiscuidade reinante. A principal falha deve ser atribuída a quem, tendo poder para isso, não criou nenhuma estrutura especializada para o combate à corrupção.

A segunda constatação sobre a tolerância zero é que ela é em si um reconhecimento de que houve até agora uma relativa tolerância a esses assuntos. Aqui tolerância quer dizer fechar os olhos, não dar a devida importância, não valorizar, deixar passar as informações sobre esbanjamento, corrupção e nepotismo. Se só agora haverá tolerância zero é porque antes não havia, logo, com a sua tolerância, alguém criou e alimentou o monstro. Fecharam-se os olhos a ponto de nunca ninguém ter sido demitido por má gestão, nepotismo ou corrupção. A conveniência de serviço foi o maior aliado público da má governação. Agravou-se o quadro com a reiterada política de nomeação para outros cargos públicos de pessoas vistas na sociedade como estando ligada ao descaminho de bens e meios públicos. Passou-se à sociedade a ideia de que o crime compensa e o gestor público, fizesse o que fizesse, teria sempre um vale dos caídos qualquer para uma segunda, terceira ou ultima oportunidade. Funções de Estado de alta dignidade como deputado e embaixador foram reduzidas a meros pontos de passagem ‹‹à espera de colocação››, desvalorizando-as em primeiro lugar, mas criando também o complexo de que uma ‹‹colocação›› de verdade, é lá onde há dinheiros, muito dinheiro para gerir, muitos contratos para assinar e a oportunidade de ‹‹resolver a vida››. Foi essa permissividade, essa tolerância que nos levou aos dias de hoje e, uma mudança, se não for demasiado tarde, não pode ser feita sem alterar radicalmente, de cima a baixo, o estilo de governação, os métodos e as pessoas.

O quarto elemento a ter em conta é que a tolerância zero só foi decretada para depois do congresso. Isso significa que até dez de Dezembro ainda são permitidas as irregularidades dos últimos trinta anos. Aliás, parece um convite aos menos avisados para que se despachem, já que depois do congresso fecham-se as portas e as oportunidades. Há anos que a situação do país exige uma acção vigorosa mas o presidente, não só a anunciou tarde, como ainda deu uma inacreditável moratória de cerca de um mês. Não admira que temendo a queda e a tolerância zero, muitos nestes dias se atirem aos cofres das empresas públicas e dos ministérios exactamente como em 1991-1992, quando se temia por uma derrota eleitoral ou agora em 2008 quando muitos temiam que não constassem de um governo novo e de estilo radicalmente diferente que, como sabemos, nunca passou da promessa.

Seja como for, é prudente avaliarmos se existem condições para a aplicação da tal de tolerância zero. Infelizmente, temos de concluir que não há condições objectivas e subjectivas para a sua aplicação. O mais que, certamente, se conseguirá é encontrar uns bodes expiatórios para sacrificar em público. Mero populismo porque as práticas e a atitude perante elas vão continuar exactamente na mesma. O maior óbice é o facto de se ter desenvolvido estruturas de poder a cultura do silencio e do ‹‹laissez faire, laissez aller, laissez passe››. Seja em que tribuna for, ninguém se atreve a criticar o projecto vindo de um camarada, mesmo quando se tem a sensação de que ele está feito só para ‹‹sacar massa››. Quem viole essa regra de ouro caminha para o isolamento e corre o risco das intrigas palacianas, dos grupos de interesse conseguirem o seu afastamento. Há, assim, um pacto de silêncio público, sobretudo dos casos em que estejam envolvidos familiares, supostos protegidos ou colaboradores próximos do presidente ou até de amigos destes. Há fortes suspeições de negócios do Estado que agora são privados, de grandes compras desnecessárias e sobrefacturadas ou de projectos de duvidosa ‹‹bondade patriótica››. Num panorama destes, tolerância zero de quem contra quem?

Todo o estilo de governação está errado e propicia as distorções que o presidente diz querer combater. Começa pelo militantismo que se instalou no país. Em muitos casos, os bons militantes não são os mais competentes governantes. Nesses casos específicos, a chegada ao lugar de ministro ou de director não é uma consequência natural de uma carreira ou da competência profissional mas antes uma inimaginável oportunidade de subir na vida. É uma irrepetível oportunidade para quem não tinha nem currículo nem o sonho de ser nomeado. O caminho é fazer o seu pé de meia antes que o sonho acabe. ‹‹Sobe-se›› também por ter o apoio e apadrinhamento de determinados grupos de interesse, o que faz com que a sobrevivência governativa do nomeado se faça à custa da dimensão do agradecimento. É preciso agradar todos os grupos que aparentem estar próximos da decisão politica de o manter no cargo ou, em caso de demissão, de o voltarem a colocar na mesma única tômbola de onde, nestes 30 anos, se tiraram sempre os nomes dos governantes. Como, assim, pode haver tolerância zero?

Um primeiro passo a sair do congresso era acabar com a generalização. Passa-se a ideia errada que todos os governantes e directores são farinha do mesmo saco. Não são. Há gente que está no governo ou à frente de empresas públicas por mérito próprio e nem carrega a suspeição de ter ‹‹abonado›› dos bens e dinheiros públicos. Nós também sabemos quem são e os respeitamos mais por isso. Portanto, não confundir. É só puxar o novelo do princípio ao fim e veremos quem é que afinal precisa de tolerância zero.■

Fonte: SA, EDIÇÃO 344 · ANO VII, Sábado, 28 de Novembro de 2009.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Tolerância Zero aos jornalistas que entrevistaram o falso Lula da Silva


Primeiro, a glória de ter entrevistado o presidente brasileiro Lula da Silva; em segundo lugar, a decepção quando se soube que se tratava de um trote (http://cangue.blogspot.com/2009/11/falso-lula-da-silva-concede-entrevista.html) e agora a margura de suspensão das atividades.

Pois é... o ministro da Comunicação Social, Manuel Rabelais, suspendeu na terça-feira, 17, a direcção da Rádio 5, o canal desportivo da Rádio Nacional de Angola, na sequência do escândalo despoletado com a entrevista feita pelo jornalista Vaz Kinguri a um homem que se apresentou como o Presidente da República Federativa do Brasil, Luís Inácio Lula da Silva.

A medida abrange o director da Rádio 5, António Rodrigues, assim como os seus mais directos colaboradores, nomeadamente os jornalistas Vaz Kinguri, director de produção, e Cândido Fortunato, secretário de redacção.

Manuel Rabelais anunciou a medida disciplinar num encontro realizado no Centro de Formação dos Jornalistas (CEFOJOR), onde participaram os profissionais da emissora.

Além da suspensão, os jornalistas António Rodrigues, Vaz Kinguri e Cândido Fortunato serão alvo de um inquérito, para se apurar as eventuais responsabilidades sobre o que aconteceu no dia da entrevista com o falso Lula da Silva.

O PAÍS apurou que apesar de a responsabilidade estar a ser atribuída ao jornalista Vaz Kinguri, chefe de produção da Rádio 5, os contactos preliminares para a realização da entrevista com o falso Lula da Silva partiram da actual direcção da própria Rádio Nacional de Angola.

Segundo fontes da RNA, Kinguri limitou-se apenas a cumprir algumas ordens de seus superiores hierárquicos que, à partida, receberam o e-mail do charlatão da Rádio Metropolitana de São Paulo, no Brasil, que se fez passar pelo Presidente Lula da Silva.

Ref. Dani Costa "O pais"

UNITA apresenta moção de Censura ao Governo da República de Angola


Segue-se na íntegra do texto de Moção de Censura ao Governo da República de Angola, apresentado pela UNITA, alegando "os incumprimentos e desvios dos objectivos e políticas aprovados pelo Plano Nacional de 2009" . A UNITA apresentou esta Moção ao Presidente da Assembleia na Nacional na segunda-feira." Dela o Senhor Presidente da República José Eduardo dos Santos recebeu cópia no mesmo dia.

O Presidente da UNITA, Samakuva, vai explicar nesta quarta-feira, dia 25, as razões da Moção e vai comentar tambem as intenções de medidas correctivas expressas recentemente pelo Senhor Presidente da República, quando falava aos dirigentes do seu Partido (MPLA) na semana finda.


MEMORANDO DE APOIO À MOÇÃO DE CENSURA AO GOVERNO

25 de Outubro de 2009

I. Introdução

Em Setembro de 2008, os angolanos elegeram um novo Governo para “mudar Angola para melhor.” No seu programa, os novos governantes comprometeram-se a “reforçar a democracia, respeitar os direitos humanos, melhorar a qualidade de vida dos angolanos, combater a corrupção, melhorar a governação e consolidar a estabilização política do país.”

Em Dezembro de 2008, a Assembleia Nacional aprovou a Proposta de Plano Nacional para o ano de 2009, submetida pelo Governo, que fixou as metas para os principais indicadores macroeconómicos e os objectivos e prioridades das políticas globais e sectoriais do Governo.

Feito o balanço do desempenho do Governo no cumprimento do Plano Nacional aprovado para 2009, as opiniões dos diversos sectores da sociedade e dos cidadãos em geral, são convergentes: Angola piorou (1). Independentemente dos efeitos da crise financeira internacional, o Governo ignorou o contrato que firmou com o eleitorado e não cumpriu os compromissos assumidos no seu programa e no Plano Nacional. Pelo contrário, abusando do mandato que lhe foi conferido:
• asfixiou e subverteu a democracia
• piorou a qualidade de vida dos angolanos
• aumentou a corrupção
• aumentou a fragilidade das instituições
• piorou a qualidade da governação e
• abalou a estabilidade política do país.

Este Memorando sintetiza os fundamentos alusivos ao não cumprimento, pelo Governo, das metas, planos e políticas aprovados para o ano de 2009. Discute também os efeitos da conduta do Governo na relação de confiança política que deve existir entre o Governo e o corpo eleitoral de cidadãos, bem assim como os fundamentos doutrinários e jurídico-constitucionais desta relação.

A gravidade dos incumprimentos do Governo e o seu carácter arbitrário, desleal e recorrente justificam a aprovação, pelo órgão fiscalizador competente, de uma moção de censura, nos termos da alínea n) do Artigo 88º da Lei Constitucional.

II. Fundamentos Doutrinários

A função de controlo político do Governo pelo Parlamento insere-se na vasta função fiscalizadora, que vai desde o controlo do cumprimento da Constituição e apreciação dos actos de governo até à fiscalização dos estados de necessidade constitucional. A moção de censura é o instrumento mais radical do exercício deste controlo. Através da moção de censura, de iniciativa parlamentar, os representantes do povo põem em jogo a responsabilidade política do Governo, implicando a aprovação da moção de censura a demissão do Governo. Este controlo parlamentar, é um controlo material, pois pode dirigir-se à fiscalização dos resultados da actividade legislativa ou à fiscalização das vias de fins da política governamental. É também um controlo pessoal na medida em que pode pôr em causa a capacidade política do Chefe do Governo, e, indirectamente, dos seus Ministros, para levarem a cabo determinada política.

Uma situação de responsabilidade verifica-se quando um órgão ou o seu titular responde perante determinadas entidades pelos efeitos derivados do exercício de uma certa actividade. Se os efeitos do agente público se repercutem na relação de confiança política que existe ou deve existir entre o titular do órgão em causa e o órgão que o propôs ou aceitou fala-se em responsabilidade política; no caso vertente, trata-se da responsabilidade política do Governo perante os eleitores, representados pela Assembleia Nacional. Quando a situação de responsabilidade deriva da lesão de um direito ou interesse legítimo por violação de determinada obrigação para com outro sujeito ou por comportamento ilícito, fala-se em responsabilidade civil; quando a situação se refere ao não cumprimento, por certos agentes, dos preceitos relativos a bens patrimoniais ou a fundos dos entes em nome dos quais agem, diz-se que há responsabilidade financeira; se a situação deriva da violação de normas directivas de carácter administrativo por agentes subordinados existe responsabilidade administrativa (cumulável ou não com responsabilidade civil ou penal); quando a situação deriva de comportamento delituoso estamos perante responsabilidade penal.

Aqui tratamos fundamentalmente da responsabilidade política do Governo, que encerra elementos inerentes à responsabilidade financeira e administrativa do Governo e da administração dele hierarquicamente dependente.

III Fundamentos jurídico-constitucionais

Nos termos do Artigo 105º da LC, o Governo é responsável politicamente perante o Presidente da República e a Assembleia Nacional. Além de se tratar de uma responsabilidade política, trata-se também de uma responsabilidade parlamentar do Governo. Isto implica a responsabilidade solidária de todo o Governo perante a AN e não de uma responsabilidade individual dos Ministros.
Acresce que o Presidente da República em exercício, que chefiou os sucessivos governos anteriores, é o Chefe do actual Governo, eleito em Setembro de 2008. Qualquer incumprimento de carácter recorrente será mais apropriadamente imputável ao Chefe do Governo.

Compete à Assembleia Nacional “votar moções de confiança e de censura ao Governo.” (Artigo 88º (n), da LC).

As moções de censura ao Governo incidem sobre “a execução do seu programa ou assuntos fundamentais da política governamental, mediante iniciativa apresentada por qualquer grupo parlamentar ou um quarto dos Deputados em efectividade de funções.” A sua aprovação exige “maioria absoluta dos votos dos Deputados em efectividade de funções.” Artº 116º (2,3) da LC.

IV Síntese do Grau de Cumprimento Geral dos Objectivos do
Plano Nacional Para o Ano de 2009

IV.1. Reforçar a democracia

Durante o ano, este objectivo não foi cumprido. Pelo contrário, acentuou-se o processo de asfixia da democracia. O Governo deixou de dialogar. Não há liberdade na imprensa pública. Os órgãos de comunicação social do Estado embruteceram, foram subvertidos e transformados nos principais obstáculos ao desenvolvimento da democracia angolana. Acentuaram-se as desigualdades e a exclusão social de motivação política. Há uma subversão da democracia.

A relação de confiança política que deve existir entre o Governo e o corpo eleitoral de cidadãos foi minada, muito especialmente pela não convocação das eleições presidenciais marcadas para 2009.

A não convocação da eleição do Presidente da II República nos termos da Lei Constitucional, constitui um atentado a dois princípios estruturantes da República: o princípio democrático e o princípio do Estado de Direito.

A agressão do princípio democrático, como princípio fundamental estruturante, significa que o Presidente da transição violou também os princípios constitucionais gerais que o concretizam, nomeadamente, o princípio da soberania da vontade popular, o princípio do sufrágio universal e o princípio de renovação dos titulares dos cargos públicos.

Ao agredir o princípio estruturante do Estado de Direito, o Presidente da República violou também os sub-princípios da constitucionalidade, da prevalência da lei e o princípio da vinculação do legislador aos direitos fundamentais dos cidadãos, em particular ao direito dos angolanos de eleger, de cinco em cinco anos, o seu Presidente da República.

A relação de confiança política que deve existir entre o Governo e o corpo eleitoral de cidadãos foi ainda minada pela inclusão abusiva das fotogravuras de Presidentes da República nos bilhetes de identidade pessoais dos cidadãos.

IV.2. Respeitar os direitos humanos

Os direitos sociais, económicos e políticos dos angolanos continuaram a ser violados pelo Governo, quer por via do esbulho das suas terras, quer pelas demolições arbitrárias das suas casas, quer pelos salários de miséria que promove, quer pela supressão do exercício do direito do sufrágio, quer ainda pelo agravamento da condição de pobreza.

Além disso, no Anexo II do Relatório da sua 43ª Sessão Ordinária, realizada na Suazilândia em Maio, a Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, acusou formalmente Angola de ter violado a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos. Angola é acusada de tratamento degradante, discriminação, deportação em massa e negação de justiça (2).

A Human Rights Watch, a AJPD, a SOS Habitat, a Omunga e outras organizações da sociedade civil, denunciaram, igualmente, as sistemáticas violações dos direitos do homem em Angola, ao longo do ano de 2009.

IV.3. Melhorar a qualidade de vida dos angolanos

A qualidade de vida dos angolanos deteriorou. A expectativa de vida do angolano continua na casa dos 40 anos. Aumentou a pobreza extrema, aumentaram as taxas de mortalidade infantil, de analfabetismo e de exclusão social. Agravou-se também a má qualidade do ensino público e dos serviços públicos de saúde. O fornecimento público de água e luz foi deficiente e irregular.

Os recursos públicos não foram utilizados para aliviar o sofrimento da maioria. O poder aquisitivo do salário médio foi reduzido. Tal como em 2008, a despesa pública social em 2009 também foi insuficiente para suster a crise social que o País vive. A inflação subiu para 14% (3) e as medidas de política monetária asfixiaram as empresas e fizeram disparar os preços. A corrupção institucionalizada e a má gestão fizeram com que efectivos das FAA, funcionários públicos e outros credores do Estado ficassem longos meses sem receber os seus salários.

Agravou-se também o fosso entre ricos e pobres. A distribuição e redistribuição da riqueza nacional foram iníquas. Acentuou-se também no seio do Governo, a cultura da exclusão social, quer por via da criminalização da pobreza, quer por via da discriminação política e social. A Polícia e outras estruturas repressivas do Estado foram utilizadas para realizar acções desumanas de migração forçada e de despejo extra-judiciais de cidadãos, que consolidaram o estatuto de pobreza sistémica para a maioria da população. Enquanto em 2002 a diferença entre ricos e pobres era medida por um coeficiente técnico de 0,55, os especialistas estimam que tal diferença, o índice de gini, subiu para 0,63, em 2009, o que tornou Angola no país com mais disparidade entre ricos e pobres, a nível mundial (4).

Enquanto isso, os recursos públicos foram utilizados para enriquecer uns poucos. Destes, a imprensa destacou Isabel dos Santos, Manuel Vicente, José Leitão e Hélder Vieira Dias. Foi dada ampla publicidade ao crescimento dos investimentos angolanos em Portugal, detidos por meia dúzia de entidades, incluindo Isabel dos Santos e Hélder Vieira Dias. Todos eles terão utilizado fundos públicos para o efeito. (5)

Em Junho, Isabel dos Santos beneficiou de uma autorização do Conselho de Ministros para consolidar o monopólio da Unitel no segmento da telefonia GSM por via de um investimento global de 2 bilhões de dólares. A consolidação do monopólio irá continuar a agravar o preço que a rede de cinco milhões de clientes forçados paga pelos serviços telefónicos daquela operadora. Foi também anunciado que o processo de privatização da Movicel, promovido pelo Governo, violou a Lei e a ética.

IV.4. Melhorar a governação e combater a corrupção

Estes dois objectivos do Plano Nacional não foram alcançados. A governação do Executivo durante o primeiro ano da legislatura, foi mais uma vez manchada pela má gestão e pela corrupção. As metas do Plano Nacional não foram cumpridas. O PIB desceu, a dívida externa aumentou, a inflação cresceu e as reservas do Tesouro desapareceram, sem explicações. Manuel Rui Monteiro disse, em Julho, que o país está sem rumo. (6)

INDICADOR: Inflação global anual
2009 OGE Inicial: 10,0%
2009 OGE Revisto: 12,5%
2009 Desempenho Estimado (7): 14%

INDICADOR: PIB Valor Nominal (mil milhões de kwanzas)
2009 OGE Inicial: 5.796,0
2009 OGE Revisto: 5.144,7
2009 Desempenho Estimado (7): 5.288,2

INDICADOR: Taxa de crescimento real (%)
2009 OGE Inicial: 11,8
2009 OGE Revisto: 6,1
2009 Desempenho Estimado (7): 6,2

INDICADOR: Preço médio de exportação do petróleo bruto (US$)
2009 OGE Inicial: 55,00
2009 OGE Revisto: 37,00
2009 Desempenho Estimado (7): 51,50

INDICADOR: Reservas do Tesouro (em Bilhões USD)
2009 OGE Inicial: 20
2009 OGE Revisto: 11,8
2009 Desempenho Estimado (7): ?

Angola voltou a descer na lista dos países que governam com transparência e que combatem a corrupção. Angola estava no 147º lugar, agora desceu para o 158º lugar. É curioso que três países com quem Angola intensificou os negócios – Portugal, Brasil e Moçambique – também desceram. Portugal desceu do 28º para o 32º lugar. Cabo Verde foi o único país da CPLP que viu melhorada a sua classificação na lista de países menos corruptos, elaborada pela Transparência Internacional (TI) (8).

O abuso do poder, o nepotismo e o enriquecimento ilícito tornaram-se impuníveis. José Leitão, presidente do grupo Gema, surgiu em Junho, em entrevista ao Novo Jornal, a exibir a aplicação da sua fortuna - retirada certamente dos cofres do Estado – em parcerias com a Edifer, nas torres que estão a ser erguidas na Avenida Comandante Gika, no Bloco 18/06, nas Pescas, etc., e em outros empreendimentos com “grupos angolanos” não identificados (9).

Prosseguiram em 2009 as denúncias de promiscuidade entre negócios públicos e privados, pelas mesmas pessoas. A organização não governamental Global Witness, revelou que Manuel Domingos Vicente, Manuel Nunes Júnior e Hélder Vieira Dias (Kopelipa), são accionistas da Sociedade de Hidrocarbonetos de Angola (SHA), uma empresa autorizada pela Sonangol, dirigida por Manuel Domingos Vicente, a concorrer na exploração de petróleo.(10)

Ficou evidente, no decurso de 2009, que Portugal tornou-se um destino seguro de fortunas desviadas do erário público angolano. Em Julho de 2009, a imprensa noticiou o depósito, na Banca portuguesa, da soma de $380 milhões, de proveniência angolana duvidosa. O advogado português, José Ramada Curto, foi contratado para defender os interesses dos alegados proprietários. O economista e bancário português, Augusto Martins, disse, a propósito, que havia pressões sobre José Sócrates, Primeiro-Ministro português, para libertar milhões de dólares de dinheiro público para determinadas contas privadas de alguns mandatários do regime, de forma a continuarem a comprar até empresas falidas, para branquearem dinheiro roubado do povo de Angola. (11)

Enquanto isso, com base num estudo documentado, a Universidade Católica evidenciou que a política fiscal do Governo continua a usurpar os recursos dos pobres, a despesa pública social foi reduzida e a taxa de pobreza angolana subiu para 68,2%. (12)

IV.5. Consolidar a estabilização política do país

Durante o primeiro ano da legislatura, a estabilidade política do País foi gravemente ameaçada pela conduta política do Chefe do Governo. Não obstante a 24ª Reunião do Conselho da República ter recomendado, e o Presidente da República ter aceitado, realizar as eleições para a normalização constitucional dos órgãos de soberania do Estado em 2008 e em 2009, o Presidente da República decidiu advogar em causa própria e estender o seu próprio mandato como PR e, concomitantemente, como Chefe do Governo.

Fê-lo em dois tempos: primeiro, por não convocar, de Janeiro a Julho, sem qualquer justificação, a eleição presidencial já marcada para 2009. Segundo, por orientar publicamente, em Agosto de 2009, a anulação do instituto da eleição presidencial. Esta conduta à margem da Lei e anti-democrática fez ruir as traves mestras da ordem jurídico-constitucional em que assenta a legitimidade do órgão electivo e representativo Presidente da República, que é também, por inerência, o Chefe do Governo e o Presidente do Conselho de Ministros.

Somente o povo soberano de Angola pode, agora, conferir legitimidade ao titular do órgão Presidente da República através do sufrágio directo, secreto e igual, para o período de 2009 a 2013, correspondente ao mandato de cinco anos previsto na Lei Constitucional.

Sem este sufrágio, o órgão Presidente da República transforma-se num poder à margem da Lei Constitucional e a ela não juridicamente vinculado.

Conclusão

Durante a primeira sessão legislativa da legislatura, a conduta do Governo revelou não haver mais correspondência entre a vontade soberana do povo angolano e aquela que foi expressa nas urnas, em 2008. E isto nada tem a ver com a crise internacional. Tem a ver com a exclusão social, a má gestão e com a corrupção. Não há correspondência, porque o Governo traiu a vontade e a confiança do povo. Em vez de governar para todos, passou a governar para um grupo cada vez mais pequeno. O Governo confundiu a vontade geral, da maioria nacional, que é social e permanente, com a vontade particular, da maioria política, que é parlamentar e sazonal. Confundiu o interesse nacional com os interesses particulares. E como o Governo foi eleito para servir o povo, é justo concluir-se que o Governo abusou da confiança do povo, geriu mal os recursos do povo e governou contra o povo.

O povo já deu o seu voto de censura a este Governo. Cabe aos Deputados, representantes do povo, significar nas instituições do Estado o voto de censura claro e inequívoco que a sociedade já atribuiu ao primeiro ano de governação do executivo dos Engenheiros Eduardo dos Santos e Paulo Kassoma.

Luanda, 25 de Outubro de 2009

O Grupo Parlamentar da UNITA

Referências:
1 - O Jornal A Capital de 5 de Setembro de 2009, publica depoimentos de populares e analistas, todos reprovando o desempenho do Governo no primeiro ano depois das legislativas de 2008. A Edição nº 92 do Novo Jornal de 23 de Outubro de 2009, publica sob o título “Decepção”um dossier sobre o desempenho do Executivo no primeiro ano de governação.
2 Novo Jornal, Edição nº 78, 17 de Julho de 2009.
3 - Estimativa do Banco Mundial.
4 - Com base no Relatório Económico de Angola de 2008, publicado pelo Centro de Estudos e Investigação Científica da Universidade Católica. O índice de gini mede as assimetrias na distribuição do rendimento nacional. O gini da Nigéria é 0,50, do Egipto é de 0,35, dos Camarões é de 0,42 e o da Noruega é 0,23.
5 - Isabel dos Santo é filha do Chefe do Governo; Manuel Vicente é o presidente do Sonangol, E.P.. José Leitão foi Director de Gabinete do Presidente Eduardo dos Santos e Hélder Vieira Dias é o Chefe da Casa Militar do Presidente da República. Todos são de famílias relativamente pobres, sem tradição de negócios.
6 - Entrevista publicada no nº 970 do Semanário Folha 8, de 18 de Julho de 2009.
7 - Estimativas do Banco Mundial, ajustadas.
8 - Www.transparency.org
9 - Suplemento Economia, 5 de Junho de 2009, Novo Jornal, página 4
10 - Novo Jornal, Suplemento Economia, página 12, 7 de Agosto de 2009.
11 - Jornal Expresso e Folha 8 de 11 de Julho de 2009.
12 - Vide Relatório Económico de Angola, 2008.

Que implicações que essa moção de Censura tem na vida de um cidadão comum e ao próprio governo?

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Gravidez na adolescência uma tragédia oculta, em Luanda


Yara Simão
Terça, 24 de Novembro 2009, 17:04

A gravidez precoce é um facto no país e em Luanda uma tragédia oculta. Nos centros municipais de Saúde e nas maternidades, as adolescentes grávidas que recorrem às consultas são cada vez mais frequentes. De Janeiro a Outubro, a Maternidade Lucrécia Paim registou 133 casos de adolescentes que deram à luz, muitas delas através de cesarianas, porque os seus corpos ainda estão em formação. O Centro Social de Saúde Nossa Senhora das Graças, no Rangel, tem uma área de maternidade e regista por mês regista mais de 20 casos, revelou a madre Norma, uma das responsáveis do centro.

Madre Norma testemunha situações complicadas na vida das adolescentes grávidas. “Muitas delas chegam aqui sem saber se estão grávidas e quando descobrem só pensam em fazer aborto, para que os pais não descubram. Outras adolescentes, dos 14 aos 18 anos, nem sequer sabem da importância do preservativo”, revelou.

“É um caso muito sério, porque são crianças que não vivem a sua infância como deve ser, e chegam aqui com o pensamento negativo de abortar, porque dão conta que são crianças e não têm condições de sustentar o filho”, afirmou a madre.

Mãe adolescente

Encontrámos no Centro da Nossa Senhora das Graças uma menina que deu à luz. Magra e com ar tímido, Maria Domingos tinha a sua bebé ao colo. Aguardava a sua vez para ser assistida. Maria Domingos engravidou aos 16 anos. Com 13 anos, já tinha relações sexuais com o namorado, mas sem preservativo.

Maria Domingos tem hoje 17 anos, frequenta a oitava classe e tem ao colo o fruto da sua ignorância, uma menina linda com um ano e poucos meses. Maria Domingos conta como tem sido difícil cuidar da criança. “Tenho que levantar cedo para ir à escola. Vivo em casa da minha sogra mas ela não ajuda a cuidar da bebé, isso provoca-me muitos problemas”, disse a mãe adolescente.

O coração de Maria fica “partido” quando vê as amigas partir para as festas e ela fica em casa “porque tenho de cuidar da criança. Às vezes penso em desistir e deixar de ser mãe, mas juro que não posso”. Maria Domingos não trabalha, é órfã de mãe, mas tem o apoio do pai: “Ficou decepcionado mas dá-me forças para cuidar da minha filha”, referiu. Com o apoio do pai, Maria Domingos aprende a amar a filha.

Elisabete Bernardo José, de 15 anos, estudante da sétima classe, está grávida de três meses. Elisabete está triste e envergonhada. Usa normalmente roupas para esconder as mudanças que seu corpo apresenta.

Elisabete Bernardo diz que tinha “uma vida sexual prevenida”, usava o preservativo, “mas um dia rebentou e aconteceu o que aconteceu”. Elisabete, mesmo com o apoio dos pais, tem medo de ser mãe. “Ainda sou criança, e não sei o que é cuidar de outra criança. Mas a minha família está a apoiar-me. Vou continuar a estudar e arranjar emprego para sustentar o meu filho”, garantiu.

A ingenuidade ainda faz parte da vida de Mariana Barnabé, de 16 anos. Grávida de quatro meses, está contente, porque vai ser mãe. “Nunca pensei engravidar, mas já que estou, sinto-me feliz”, referiu.

Mariana diz que “agora o meu namorado tem de trabalhar para sustentar o filho dele, porque não fiz sozinha. Vou continuar a estudar”, diz sorridente. Como Mariana, encontrámos muitas adolescentes grávidas que aguardavam consulta no Centro Social de Saúde Nossa Senhora das Graças, no Rangel.

Quase todas as adolescentes dizem que trabalho é tarefa para os homens que as engravidaram e a elas cabe a continuação dos seus estudos. Mas a realidade é diferente e toma dimensões de tragédia.

Realidade assustadora

A adolescência é a etapa ouro do ser humano e na adolescência as meninas começam a desenvolver-se corporalmente e a descobrir a sua sexualidade, diz o director da Maternidade Lucrécia Paim, Abreu Pecamena, “Elas começam a sentir-se adultas e querem descobrir tudo o que os adultos fazem”, revelou. Abreu Pecamena disse que está provado mundialmente, que as adolescentes engravidam sem saber como e quando. O director Maternidade Lucrécia Paim diz que Angola não foge à regra e é cada vez mais precoce o início das relações sexuais e, ao mesmo tempo, a gravidez na adolescência. “Não tenho um estudo específico da percentagem da gravidez precoce na sociedade, mas posso garantir que os casos são assustadores”, salientou. “Temos esta noção porque a maternidade é um hospital de referência e no ano passo foram registados muitos casos”.

Abreu Pecamena diz que a falta de educação sexual nas famílias e nas escolas é uma das causas da gravidez precoce e do alto índice de casos de sida, “porque os adolescentes fazem sexo sem protecção e isso é muito preocupante, para um país em desenvolvimento”.

O número de cesarianas também preocupa a direcção da Maternidade Lucrécia Paim. “A fisiologia de uma adolescente não está preparada para um parto, elas têm a bacia pequena”, esclareceu.

O aborto é frequente na Lucrécia Paim. O director da maternidade frisa que muitas jovens engravidam e não sabem, quando descobrem entram em conflito com a situação e recorrem ao famoso Sitoc, um medicamento perigoso, usado pelas mulheres para provocarem o aborto. “Temos um número elevado de abortos sobretudo nesta fase do ano, devido aos meses que se seguem ao cacimbo”, explicou.
Aborto, Aborte essa Idéia! Aborto.com.br - gravidez, parto, gestação, feto.
Muitas jovens praticam o aborto nos centros clandestinos e quando as coisas correm mal vêem para a maternidade. “O nosso dever é salvar vidas, por isso recebemos todos os casos. Posteriormente aconselhamos os encarregados de educação, porque muitas vezes são eles que pedem para que se faça o aborto às filhas”, revela.

Abreu Pecamena diz que existe na maternidade uma consulta só para adolescentes, onde são explicados os cuidados a ter durante a gestação. “Temos tidos alguns casos de rejeição do bebé pós-parto, por isso realizamos estas consultas para que a adolescente esteja preparada para a sua nova fase de vida”. Pedro Capingano, psicólogo na Sonair, traça o quadro da tragédia: “muitas adolescentes escondem a gravidez, saem de casa, pensam em abortar, abandonam escola, perdem os amigos, criam o sindroma de isolamento, que também, acarreta outros vícios como o álcool, prostituição, depressão e ansiedade”.

O psicólogo considera que “existe pouca informação na transmissão de valores entre pais e filhos. A informação sobre a sexualidade deve começar na família. Falar da importância do uso do contraceptivo aos filhos é fundamental, porque quando uma criança não é informada pensa que já sabe tudo”, frisou.

O psicólogo considera que a gravidez na adolescência é uma realidade cada vez mais presente. “A adolescente e o seu filho são particularmente vulneráveis aos riscos inerentes à gravidez e maternidade, devido à especificidade das alterações que ocorrem nesta fase etária”.

Educação sexual como disciplina

Pedro Capingano disse que as igrejas têm aconselhado a prestar maior atenção ao problema da gravidez precoce. A educação sexual, como disciplina escolar, disse, vai ajudar muitos jovens a obter maior e melhor informação. “A escola tem um papel fundamental porque deve ensinar o adolescente a conhecer o seu corpo. Os programas de educação sexual transmitidos nas escolas desempenham um papel insubstituível, porque permitem o diálogo e a circulação de informação sobre a sexualidade, sem preconceitos, superando todas os tabus”, disse.

A madre Norma, do Centro Social de Saúde “Nossa Senhora das Graças” lembrou que, no passado, as estratégias de educação sexual incidiam na anatomia e fisiologia do sistema reprodutor, e em ensinar comportamentos típicos da vida familiar. A madre diz que, actualmente, a educação sexual deve abordar os problemas da sexualidade nos adolescentes.

Madre Norma aconselha aos encarregados de educação a conversarem com os adolescentes. “Façam perguntas, falem sobre o uso do contraceptivo. É importante que os jovens falem e sejam ouvidos”, disse a madre, que pediu ao Ministério da Educação para adoptar a disciplina de Educação Sexual, nos próximos anos lectivos.

“Gravidez na adolescência é sempre uma situação que motiva angústias e incertezas. Contudo, a adolescente demonstra a maior parte das vezes orgulho em ter o filho, pretendendo assim levar a gravidez até ao fim. Esta gravidez pode ser um marco de mudanças seus comportamentos e das suas atitudes”, afirma a madre Norma.

Fonte: http://jornaldeangola.sapo.ao/18/0/gravidez_na_adolescencia_uma_tragedia_oculta

Num artigo que fiz " Televonela é o crack na nossa sociedade" (http://cangue.blogspot.com/2008/01/telenovela-eh-o-crack-da-nossa.html) ja apontava essas consequências.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Seca causa morte de milhares de peixes em rio do Amazonas

Seca causa morte de milhares de peixes em rio do Amazonas

Angola tem condições de evitar situações semelhantes no futuro.

Rio Manaquiri, afluente do Solimões, circunda cidade de mesmo nome.
Morte dos peixes é consequência da desoxigenação da água.
Da Agência Estado


Seca causa morte de milhares de peixes em rio do Amazonas

Seca na região do rio Manaquiri, afluente do Solimões, gera desoxigenação da água e morte dos peixes. O rio circunda a cidade de Manaquiri, no Amazonas. (Foto: Bruno Kelly/A Crítica/Agência Estado)

Fonte: http://www.globoamazonia.com/Amazonia/0,,MUL1388237-16052,00-SECA+CAUSA+MORTE+DE+MILHARES+DE+PEIXES+EM+RIO+DO+AMAZONAS.html

domingo, 22 de novembro de 2009

Com a mesma quantidade de dinheiro compramos muito mais produtos no Brasil do que em Angola


    O Presidente do MPLA JES fez um discurso aos membros do Comité Central dos "camaradas". Aqui vão vão os principais pontos do discurso:


  • “No nosso país os preços só sobem, nunca descem”;

  • Pediu, ontem, tolerância zero ao esbanjamento dos recursos e à fraude, e reconheceu que a “transparência dos actos de gestão e a boa governação são frentes em que há muito trabalho a fazer”.

  • O MPLA como partido maioritário e no governo “aplicou timidamente o princípio de fiscalização dos actos de gestão do Governo, através da Assembleia Nacional e do Tribunal de Contas”. Esta circunstância foi “aproveitada por pessoas irresponsáveis e por gente de má fé para o esbanjamento de recursos e para a prática de acções de gestão ilícitas e mesmo danosas ou fraudulentas”.

  • Sugeriu um estudo aprofundado para aumentar o poder de compra dos salários. Entende que não basta aumentar os salários, se não se fizer baixar os preços dos produtos.

  • O país ainda importa mais de 80 por cento de tudo que consome. “Com a mesma quantidade de dinheiro compramos muito mais produtos no Brasil do que em Angola” .

  • A eleições legislativas e presidenciais têm que ocorrer simultaneamente para economizar-se dinheiro.

    (Comentário: 1)O povo queria que eleições presidenciais e legislativas ocorressem em simultâneo, em 2008; foi o MPLA que insistiu na tese da "mãe coragem" em realizar as presidenciais em 2009. 2) Com 30 mil dólares compro, no Brasil, uma residência razoável, daquelas que em Angola custam 500 mil dólares. Há um gato nisso!! Talvez fosse o caso de se lançar sangue novo, a quebra de monopólios e deixar o jogo aberto (livre concorrência)).

Lei seca aos menores de 18 anos. Escola e trabalho neles!!


Consumo de álcool é dramático

A venda, compra e consumo de álcool por menores de 18 anos tem atingido, em Luanda, “níveis dramáticos”, afirmou, ontem, em conferência de imprensa, a vice-governadora para a Área Social, Jovelina Imperial.

A vice-governadora, que falava a propósito do edital que estabelece normas de consumo e de venda de bebidas alcoólicas a menores, disse que a província de Luanda tem um grande número de jovens a consumir álcool.

Jovelina Imperial frisou que o álcool “já é um grande problema, quando consumido por adultos”, mas que ainda é “mais dramático”, quando são menores a fazê-lo.

“Também fica proibida a participação de menores de 18 anos em certos recintos de espectáculos”, disse.

Um comunicado, do governo provincial de Luanda esclarece que cidadãos, estabelecimentos comerciais e discotecas, que forem apanhados a vender bebidas alcoólicas a menores de 18 anos, lhes serão aplicadas multas pesadas.

Jovelina Imperial pediu aos pais e encarregados de educação que não mandem os jovens aos estabelecimentos comerciais comprarem bebidas alcoólicas, na medida que a “convivência da criança com o álcool pode torná-lo, também, um consumidor de bebidas”.

Jovelina Imperial pediu, igualmente, aos proprietários de estabelecimentos comerciais que colaborem no cumprimento do que foi estipulado pelo governo provincial quanto à venda álcool e à permanência de menores em determinados recintos de diversão nocturna.

Fonte: http://jornaldeangola.sapo.ao/18/0/consumo_de_alcool_e_dramatico

Mulheres casadas têm mais fantasias sexuais com outros homens


Ainda bem que em Angola não temos este tipo de pesquisa

Atores Ben Affleck e Will Smith são os mais cotados pelas americanas, diz estudo

Depois de dizer o "sim" no altar, a imaginação feminina pode ser mais picante do que a masculina, quando o assunto é sexo. Pelo menos é o que constata um estudo realizado pela Universidade da Pensilvânia, realizado com mais de três mil mulheres casadas dos Estados Unidos. De acordo com a pesquisa, após o casamento, a relação que a mulher estabelece com o sexo muda, fazendo com que ela tenha mais fantasias sexuais com outros homens.

A pesquisa mostrou ainda que os atores hollywoodianos Ben Affleck e Will Smith (Foto) são considerados os casados famosos mais presentes nas fantasias sexuais das americanas avaliadas.

Durante o estudo, foram feitas perguntas para homens e mulheres sobre sexo, amor e fantasias sexuais. O questionário envolvia perguntas como: "Você tem vontade de sair com outros homens?" ou "Você se casaria com a mesma pessoa novamente?".

Os resultados dos testes revelaram que 49% das mulheres consultadas sentem vontade de transar com outros homens, sendo que 34% delas não se casaria com o mesmo homem. Enquanto os homens apresentaram-se mais recatados: 36% sentem vontade de manter relações sexuais com outras mulheres, destes, 43% já mentiram sobre traição para as esposas e apenas 15% se casariam com outras

Outras perguntas revelaram que 76% das mulheres consultadas guardam segredos dos maridos, e ainda, que 84% gostariam de saber se o parceiro a engana com outras. Mais de um terço das mulheres ouvidas disseram que se apaixonam por outros homens de forma constante e acham isso natural.

Para os pesquisadores, o estudo indica uma mudança comportamental das mulheres em relação ao sexo e ao prazer. Segundo eles, as mulheres deixaram de associar sexo ao amor e se sentem mais livres para colocar para fora suas emoções e sentimentos, que durante décadas foram reprimidos por questões culturais.

Fonte: http://yahoo.minhavida.com.br/conteudo/10587-Mulheres-casadas-tem-mais-fantasias-sexuais-com-outros-homens.htm

sábado, 21 de novembro de 2009

Brasileiros leem apenas um livro por ano, aponta estudo



Brasileiros leem apenas um livro por ano, aponta estudo

País fica atrás da Colômbia no indíce de leitura; baixo orçamento reflete na estatística

Agência Brasil

BRASÍLIA - Um levantamento do Instituto Pró-Livro confirma que o brasileiro lê pouco. São 77 milhões de não leitores, dos quais 21 milhões são analfabetos. Já os leitores, que somam 95 milhões, leem, em média, 1,3 livro por ano. Incluídas as obras didáticas e pedagógicas, o número sobe para 4,7 - ainda assim baixo.

Os dados estão na pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, feita com 5.012 pessoas em 311 municípios de todos os Estados em 2007. "O livro é pouco presente no imaginário do brasileiro", explica o diretor do Livro, Leitura e Literatura do Ministério da Cultura, Fabiano dos Santos.

Nos Estados Unidos, por exemplo, a população lê, em média, 11 livros por ano. Já os franceses leem sete livros por ano, enquanto na Colômbia, a média é de 2,4 livros por ano. Os dados, de 2005, são da Câmara Brasileira do Livro (CBL) e do Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Snel), que integram o Instituto Pró-Livro.

Detalhes dos hábitos do brasileiro relacionados ao livro, revelados na pesquisa, atestam esta afirmação. O levantamento considera como não leitores aqueles que declararam não ter lido nenhum livro nos últimos três meses, ainda que tenha lido ocasionalmente ou em outros meses do ano.

Entre os leitores, 41% disseram que gostam muito de ler no tempo livre, enquanto 13% admitiram que não gostam. Também entre os 95 milhões de leitores brasileiros, 75% disseram que sentem prazer ao ler um livro, mas 22% sustentaram que leem apenas por obrigação. Apenas 7,47% da população brasileira compram livros não didáticos e destinam à literatura o equivalente a 0,05% da renda familiar. O pouco orçamento destinado à leitura se reflete em que 60% dos brasileiros nunca abrem um livro.

Com as estatísticas nas mãos, Fabiano dos Santos diz que há dois caminhos a percorrer para fazer do Brasil um país de leitores: ampliar o acesso ao livro e investir na formação de leitores. A pesquisa Retratos da Leitura no Brasil sugere que a maior influência para a formação do hábito da leitura vem dos pais, o que explica o fato de que 63% dos não leitores informaram nunca terem visto os pais lendo.

Por outro lado, o levantamento sugere que o hábito de ler é consolidado na escola e quanto maior o nível de escolaridade, maior o tempo dedicado à leitura. Entre os entrevistados com ensino superior, há apenas 2% de não leitores e 20% disseram que dedicam entre quatro e dez horas por semana aos livros. Este índice cai para 12% entre estudantes do ensino médio.

"É em casa e na escola, que os leitores são formados. Depois dos pais, os professores são os maiores incentivadores, mas poucos têm a experiência da leitura. E, neste caso, fazer do aluno um leitor é uma mágica", diz o diretor do Livro do Ministério da Cultura.

O professor de Literatura Dilvanio Albuquerque considera que o desinteresse do brasileiro pelos livros não pode ser atribuído apenas à família e à escola. "O problema é mais amplo. Não podemos falar que a culpa é da instituição, seja ela familiar ou escolar, porque, na verdade, o problema é cultural".

Para o professor, até entre os universitários, o hábito da leitura não é comum, inclusive nos cursos em que o contato com a escrita é fundamental. "Normalmente a universidade não oferece um bom acervo. Moramos em um país em que os livros são caros e de difícil acesso", disse.

O estádio de Luanda chama-se "11 de Novembro"


O novo estádio de Luanda, construído para abrigar o campeonato Africano das nações de futebol passa-se a se chamar de "Estádio 11 de Novembro"

Segue-se o comentário do semanário angolense:

Em paragens normais, baptizar um estádio de futebol com a data da independência do país seria a coisa mais normal. Por esta África fora, os principais estádios de futebol são designados pelas datas das respectivas independências nacionais.

Entre nós, entretanto, a atribuição do nome de 11 de Novembro ao novo estádio de Luanda foi recebida com profundo... alívio. O excessivo tempo que as autoridades do país levaram a encontrar a designação para o novo estádio fez temer o pior. E o pior é que ao novo recinto desportivo fosse atribuído o nome do cidadão José Eduardo dos Santos. Felizmente o bom senso venceu.

Mulheres marcham em biquini por recorde



No passado sábado, acidade sul-africana de Joanesburgo quebrou o recorde do maior desfile de mulheres em biquini. De acordo com a agência France Press, 1.690 mulheres participaram do desfile, assistido.

Muitos dos leitores estarão certamente a perguntar-se quando Luanda quebrará este recorde. Na capital angolana, não seria certamente nada difícil reunir 2 mil mulheres para um desfile em biquini. Vamos ver se alguém aproveita a ideia e traz para cá os representantes do ‹‹Guinness Book››, a ver se Angola passa a estar mais presente nesse livro.■

Fonte: SA

Ditador é apenas quem está no poder há 32 anos


Foi uma entrevista muito bem humorada. Não me lembro algum dia ter lido uma entrevista assim. Vale apenas ter paciência e ler do início ao fim. Ele, por exemplo, sonha ter a sua cara no «BI» dos outros. Não pensei duas vezes para reproduzí-la neste blog.

"Ditador é apenas quem está no poder há 32 anos"

Como a JES faltam dois anos para chegar a tal fasquia, então ainda não está na classe dos tiranos. Sugere, com refinadíssimo humor, o ex-radialista, preso em 27 de Maio de 1977, em pleno estúdio na RNA onde apresentava o programa «Kudibanguela»

O programa radiofónico Kudiganguela, emitido até ao dia 27 de Maio de 1977, de que eras apresentador, tinha uma palavra de ordem, segundo a qual, «No dia em que o Kudibanguela acabar, é porque o fascismo entrou em Angola». Será que esta predição se concretizou?

JC – Aquilo era uma espécie de premonição. A PIDE-DISA andava aí a vasculhar e criámos essa frase, que eu desconfio que continue a ser a mais emblemática até agora, que é: «No dia em que o Kudiganguela acabar é porque o fascismo entrou em Angola».

"Acho que aqui não tem oposição, por uma razão muito simples: rádio, televisão e imprensa não estão nas mãos deles, são meios de comunicação públicos."

SA – Há algum político angolano que te cative?

JC – Aqui dentro de casa, não. Lá fora, aquele gajo do Obama. Como é mulato e aqui estão a dizer que é preto, é negro, epá, também fica complicado se eu falar dele. Mas já que você quer uma opinião, o maior orador que nós já tivemos aqui, isso como agora está liberalizado, as imagens vêm no Bilhete de Identidade, por aí fora, digo-te que, seguramente, o maior orador que tu já tiveste aqui neste país é o Jonas Malheiro Savimbi. Maior orador, porque aí tem muito sacana que não sabe o que é orador e não sabe o que é político e depois vai dizer porque, olha, afinal, aquele gajo só tem amigos na UNITA, quando é mentira


Ele garante que foi o primeiro negro a entrar na Rádio Nacional de Angola, nos idos de 1974, como jornalista. E jura a pés juntos que viu o Criador, o próprio Deus, a fazer as «necessidades maiores» nas barrocas do Miramar. Aliás, zanga-se com quantos «ousem» duvidar dessa afirmação que raia a heresia. Mas assim é o entrevistado do Semanário Angolense, José Carrasquinha de sua graça, proprietário da «Sarrabulho Corporation», lá no «Lusaka» (é no Sambila, não confundir com a capital zambiana).

É um angolano que olha para as coisas sérias da vida sempre com esse lado do seu carácter: um apurado senso de humor. E quando expõe as suas ideias, fá-lo geralmente recorrendo a uma linguagem que mistura o português corrente com o calão, enfiando pelo meio um ou outro termo em inglês desenrascado. Carrasquinha continua a aguardar pelos seus salários desde que foi forçado a sair da Rádio em 27 de Maio de 1977, altura em que foi preso e acusado de ser fraccionista. Desmentindo a acusação, assegura que o fraccionismo não existiu e que foi «palavra só para matar o outro». Durante a longa conversa com o SA, esta foi, de resto, a parte em que Carrasquinha acusou o toque e se mostrou magoado. Mas foi como uma sombra fugaz, pois de imediato voltou a descontrair-se. Cidadão atento aos sinais dos tempos, ele defende o modelo de eleição presidencial directo e pede aos gestores públicos um pouco mais de contenção na forma como assaltam o erário: «não sejam tão gatunos», diz Carrasquinha, que também tem uma veia musical, pois foi vocalista do grupo de rock «Turma do Cabelo Mau», ou ainda «Quinta Sinfonia», que nos anos 70 superlotou salas de cinema como as do Miramar, Avis, Restauração, Ginásio e o Autódromo de Luanda. Para os mais próximos, ele é também o Zuze Dya Ngana, alcunha que adoptou na prisão para iludir a vigilância dos «pidescos da DISA».
Em suma, caro leitor, siga uma daquelas conversas do género «fait-divers», mas da qual podemos tirar ilações sérias. Muito sérias mesmo!

Pascoal Mukuna

Semanário Angolense (SA) – José Carrasquinha, faça uma breve trajectória da tua vida até teres entrado na Rádio Nacional.

José Carrasquinha (JC) – Andei um tempo no Luso, que hoje é Lwena. Andei também na Kanata e no Liro, que agora chamam província de Benguela, mas para nós é «província do Lobito». Estacionei em Luanda no bairro Flores, que é a central do Sambizanga, até aos dias que correm. Se me perguntares qual é a minha idade direi que sou mais velho, mais nada. Antes de entrar na Rádio, eu trabalhei no jornal «O Comércio», mas comecei nas lides jornalísticas na revista «Notícias». Então, certa vez, por causa duma «loira», (mulher) eu pretendia escrever um livro. Como azar de preto nunca vem só, tive dois problemas aí por aí e queria vender uns rascunhos no antigo Prémio Cuca de Literatura. Afinal, preparei mal o dossier e cheguei tarde. Então, resolvi vender aquilo. O parque gráfico era competitivo. Fui a duas gráficas, mandaram-me lixar. Fui ao «Notícias», onde encontrei um colonial chamado Moutinho Pereira, e esse gajo é que pergunta «quanto é?». Eu disse quatro mil escudos e ele disse: «Oube lá, tu ficas aqui a ganhar 4 mil escudos por mês. Não é melhor?». Eu respondi que sim. «Então, quando é que queres começar?», eu disse «hoje já». Ele pediu que voltasse dois dias depois, e pediu o meu bilhete. Comecei. O homem foi-me ensinando onde se põe quem, o quê, como, quando, porquê, o básico. Então, chega o 25 de Abril e o Moutinho muda-se para o jornal «O Comércio», para onde também me leva. Quer dizer, eu era o miúdo dele. Um dias desses, havia uma greve nas Obras Públicas e numa espécie de conferência de imprensa, era eu pel`«O Comércio» e o Francisco Simons pela Rádio Nacional a fazermos perguntas. Parecia uma disputa. Nós dois monopolizámos a palavra. Parecia-me que ele, como mais velho, não queria ser o penúltimo a fazer pergunta. Dois dias depois, recebo um convite e entro como o primeiro preto lá na Rádio Nacional. Porque já lá estavam o Zé Viola, parece que o Dionísio na Voz de Angola. Eu entro tipo «free us bird», quer dizer, livre como um pássaro. Ganhava uma vez e meia mais do que no jornal. Aí não tem discussão: jocker vai onde tem troco. Foram anos porreiros, criei bons amigos e bons inimigos, como não pode deixar de ser, e estou aqui.

SA – É verdade que continuas à espera dos teus salários na Rádio Nacional de Angola desde 1977, ano em que foste parar à cadeia por causa do «fraccionismo»?

JC – Isso é inquestionável! É aquilo que é devido. É de esperar. Portanto, continuo à espera.

SA – Sei que tentaste regressar à Rádio Nacional e foste impedido. Ainda alimentas essa esperança?




JC – Essa é aquela conversa de que um indivíduo, num primeiro instante, naturalmente, sente aquele desejo ardente de voltar a recuperar a mística, etc., etc. Mas, para te ser sincero, nos dias que correm, não vejo piada nenhuma. Porque se eu lá voltar, por exemplo, o teu filho onde é que vai trabalhar? O miúdo já está em idade de laborar. Os tais mais velhos como eu fiquem aí na vadiagem. Até tem piada. Agora, estou a arranjar aí uma nova função, que é a de director nacional dos vadios. Quer dizer, o comité de especialidade dos vadios. Não, não há razões para voltar.

SA – Faça uma análise sobre as liberdades de imprensa e de expressão em Angola?

JC – Por acaso até, antes desta entrevista, estava aqui a ter essa conversa com um parceiro. A questão que se coloca é o que é a liberdade de imprensa e o que é a liberdade de expressão. Há muita malta aí no «Jornal de Angola» que é do meu tempo. Parece que um desses assessores portugueses ou luso-angolanos que lá estão é do meu tempo. Hão-de concordar comigo que liberdade de Imprensa parece que é de acordo com a óptica do utilizador, como agora está na moda dizer. Essa curva toda que eu te dei é para dizer que há um bocado de liberdade de imprensa; não há na totalidade. Por exemplo, nos vossos jornais, você critica e lá vem alguém, provavelmente com ordens superiores, a dizer sai uma acção judicial contra o fulano, contra o sicrano. Recordo-me aí há tempos, num jornal, onde porque o indivíduo expressou a sua opinião de que talvez o Presidente não fosse inocente em relação a este e àqueles actos, veio o martelo-mor e pisou- lhe os pés. Parece que o processo corre aí. Portanto, estamos mal de liberdades de imprensa e de expressão. No aspecto desta última, às vezes não vale a pena falar disso, por uma razão muito simples: quando o outro diz que é dono da casa, tu vais dizer o quê?

SA – Os processos movidos contra a Luísa Rogério, o Victor Silva e a Ana Margoso por Tchizé dos Santos enquadram-se nisso que acabaste de dizer?

JC – Bem feitas as contas, aquela senhora que moveu a acção judicial contra esses parceiros creio que manifestou uma fraqueza ou foi muito intempestiva, porque ela não precisava disso. Essa tal fraqueza que eu disse há pouco… Eu não a conheço, mas fico com a impressão... Epá, era suposto que uma senhora com tal grau académico (parece que é formada em comunicação social) estivesse preparada para debates e, na base de argumentos, dizer: «ouve lá, ó Luísa, fique a saber que é assim, assado e cozido». Mas não sei o que lhe deu na consciência para que ela movesse essa acção. À partida, se isso aqui funcionar como deve ser, não vai sair nada. Como aqui no «Lusaka» [Sambizanga] a malta diz, sai fumo! Já tenho as minhas contas feitas sobre quem é ditador e quem não é. Para mim, ditador é quem está no poder há 32 anos. Ora, ela é filha do Presidente e ainda por cima do nosso país. Como o Presidente ainda não está há 32 anos no poder, não é ditador. Logo, por extensão, ela não é.

SA – Entre os jornais, as rádios e as televisões, quais são os teus eleitos?

JC – Em termos de televisão, a nível nacional, o que eu gosto é a Zimbo, talvez por ser novidade. Jornais, eu todos os fins-de-semana compro três: o «Semanário Angolense», o «Folha 8» e o «Novo Jornal».

SA – Como jornalista que acompanha a actividade jornalística em Angola, na tua óptica, há algum jornalista que já devesse vencer o Prémio Maboque de Jornalismo mas que ainda não tenha sido galardoado?

JC – Há, seguramente, e deviam receber com retroactivos. São o director do vosso jornal, o cambuta, o Gustavo Costa e o William Tonet. Eu como ando muito aborrecido com esses prémios, a mim não me dão prémios, o meu prémio é o dinheiro que o MPLA me deve. Mas eu aqui o meu nome é paciência, porque fui eu que dei essa letra, «Paciência», lá para o Matadidi Bwana Kitoko.

SA – Não me diga!

JC – Estás a duvidar?

SA – Ok. Que trabalho jornalístico mais te marcou?

JC – Provavelmente foi quando o Marcelino dos Santos me salvou de ser degolado pelos seguranças de Samora Machel, em Moçambique. Eu estava a passar na lateral para conseguir um furo. Ou o Jonas. Tu fazes-lhe uma pergunta e ele dá-te o troco. No Huambo, perguntei-lhe uma coisa, o homem respondeu. No Lobito, fiz-lhe a mesma pergunta por outras palavras, ele afirmou: «eu já te disse».

SA – Algum conselho para a nova geração de jornalistas, em particular os das rádios?

JC – Eu já cometi. E quando digo eu, desconfio que os outros do meu tempo, se tiverem honestidade, hão-de reconhecer isso. O erro que eu cometi é que eu fazia mais propaganda do que jornalismo. Então, é essa vacina que a gente deixa para essa raça que aí está. Eles que façam o favor de aprender, já não sou eu que vou ensinar. Mas aprender com pessoas capazes, porque jornalismo é uma coisa e propaganda é outra. É este o conselho.

SA – Tiveste acesso aos projectos de Constituição do MPLA e da UNITA? Se sim, qual o que melhor se adequa aos teus anseios?

JC – Presidente não deve ser bêbado. Presidente governa quatro anos, depois vai para casa. Porque a alternância gera progresso. O outro gajo quando lá chega, diz, «não, eu vou mudar, essa história de ter aqui duas garrafas em cima da mesa não dá, fica só uma, é mais estético». Isto é o básico. Presidente não pode ser bêbado. Sabes que os bêbados falam à toa e depois pode dar desastre. E se não concordarem com a minha ideia, então digo: presidente pode ficar lá cem anos ou até morrer, é a melhor maneira de você evitar problemas. Assim, não tem essas conversas que estão a dizer que o Man Zé quer ficar lá toda vida, porque o Man Zé mentiu, não. Essa, vamos acertar devida e definitivamente. E que não ponham a cara do outro indivíduo no meu bilhete de identidade. Tu sabes qual é o nome que eu dei a esta rua? Quer dizer, cada um valoriza o pai dele ou a mãe dele. Aqui em cima é Travessa da Dona Ana. Essa da Corporation é Rua do Sô Silva, está lá nas Finanças e vejo quando vou pagar o imposto.

SA – Mas, nós já tivemos algum Presidente bêbado?

JC – Tira as ilações que quiseres?

SA – Como vês o processo de reconciliação nacional em Angola?

JC – Presumo que a reconciliação nacional neste momento ainda está no papel. Na rua ou na prática, nós não vemos. Porque tenho estado a notar que desde a capitulação da UNITA ou mesmo antes disso, se não estou enganado, já houve aí cerimónias de atribuição de medalhas disto e daquilo. Parece que os outros oficialmente não lutaram e alguns que tiveram a sorte de entrar no último saco receberam umas medalhas daquelas que um indivíduo diz para inglês ver. Esse é um aspecto. O outro, a verdadeira reconciliação vai começar no dia em que virmos aí uma rua chamada Gentil Viana, Matias Miguéis, José Carrasquinha, Nito Alves, Monstro Imortal, Mário Pinto de Andrade, essa malta toda, ou bustos em homenagem deste ou daquele, aí podemos ter a certeza que se está a dar passos largos no sentido da reconciliação nacional. Se reparares, o factor principal para a dita reconciliação nacional é o MPLA, não tem mais outro partido. É esse partido que tem de fazer as pazes com ele mesmo e com os outros. Há dias, há um palerma que me disse que o Augusto Ngangula foi fundador do MPLA. Eu muitas vezes gosto de dizer, pois, o «Works Party» gosta de ardósia, não gosta de quadros. Ora, esse tipo com essa mentalidade, quando lhe disseres, olha, o Mário Pinto de Andrade, etc., etc., ele vai dizer que não. Enquanto tu disseres que sim, ele pega numa marreta e dá-te. A reconciliação começa já por aí, não estar aqui a inventar histórias, lá dentro, primeiro, depois aqui fora.

SA – Como interpretas as constantes mudanças de posição do presidente do MPLA e, em consequência, do seu partido em relação ao modelo de eleição presidencial?

JC – O mundo hoje é quase tudo em linha recta. É por isso que tem aquele português que diz globalização. A tendência quase generalizada é realizar eleições directas, mais nada. Agora, quando você vem porque, porque, porque, eu, infelizmente, fico a pensar que isso é uma forma de um indivíduo ficar no poder até morrer. Aponta aí: penso que as eleições devem ser directas, mais nada. Quando o outro gajo vem cá te contar que evoluiu, amanhã ele vai dizer, não, nós não só evoluímos, também diluímos, depois progredimos. Até quando você torrar os ossos todos no inferno, diz, sim senhor, a nação está em paz.

SA – Tens alguma previsão sobre o vai acontecer no próximo congresso do MPLA?

JC – Aquilo é uma armadura muito segura. Deixa só te dizer uma coisa: o Man Zé, se tiver físico para tanto, daqui a mil anos, ele continua lá. Da forma como aquilo está, eu estive aí a ler, você não tem maneira de lhe tirar. Essa é aquela conversa da tropa, você para queixar o chefe que te bateu, lhe entrega a informação para ele dar ao superior dele.

SA – Quem é o Man Zé?

JC – Man Zé é só aqui no bairro. É o kota Man Zé Eduardo. Antigamente era «Viajante». Essa alcunha dele eu não sei. O Man Pascoal Kabuja foi quem me contou, o avilo dele. O estilo dele é cara podre. Tem pouco gajo aqui no território que diz que se dava bem com ele. Ele ficava como quem diz «dimoxidié». Quer dizer, estou aqui, estou bem. Quando digo Man Zé estou a referir-me ao Presidente. Se aí tem esses protocolos de que tinha de falar Sua Excelência, então suspende a entrevista para que eu lhe vá informar primeiro e depois publicares. Não é assim? Parece censura.




SA – Apesar de se apregoar que Angola está a desenvolver-se, isso não se traduz em desenvolvimento humano. Não é um paradoxo?




JC – A questão aqui tem a ver com a nossa forma de ser. Nós, ou melhor, vocês a maioria dos angolanos, para começar, são burros! Noventa e oito por cento dos angolanos são burros. Sobram 2%, que são esses que comandam. Portanto, quando tu estás a chocar com um gajo que tem ramela nas vistas, tudo que tu lhe dizes ele aceita, «sim, senhor, “tá, longo, tá longo”». E como é que tu invertes isso para não haver 98% de burros? Escolaridade de qualidade, aqui não tem, porque você não paga bem os professores. Agora nessas eleições, um dirigente do SINPROF disse: «Eu agora apoio o MPLA». Muito bem, não é crime.




SA – Estás a falar também da má distribuição da riqueza?




JC – Para distribuir bem, é muito simples: concurso público. Financiamento até x por cento para quem te apresente mesmo características de empresário. Não é um gajo que tu não sabes onde foi que ele trabalhou, de repente é presidente do conselho de administração de não sei quê, quer dizer, «tá lunguta» [rico], não pode. Essa tal distribuição se for mesmo equitativa, aqui a fome, pobreza, etc., etc., acaba. Não acaba na totalidade, porque lá em altos países «mangweles» [estrangeiros] onde eu passeio, vejo. Tem pobre em todo lado, mesmo no céu. Portanto, aqui, é inquestionável que haja. Agora, para acabarmos isso ou reduzirmos drasticamente é muito simples. É isso que acabei de dizer: distribuam bem! Como é que vão distribuir? Vou só dar um exemplo: essa história das empresas públicas. O João é PCA, aquilo é temporário, parece que são 4 ou 3 anos. O gajo nesse tempo se «dibangou», quer dizer, fez-se. Sai, entra o Mukuna, depois entra o outro, estás a ver, é o que você pode dizer está a dispersar o capital. Se tu estiveres a fazer essa distribuição, que eu chamo distribuição de cargo, mesmo nesse sistema que a gente vive aqui, o dinheiro já não vai sempre para o mesmo canal. Vamos para outro exemplo muito simples: Se estiveres a dar dinheiro todos os dias a um dos teus filhos, o dinheiro nunca mais sai de casa. Mas se olhares para um sobrinho ou um primo que a gente aqui gosta de chamar de 4º grau, que se calhar mora no Kuando Kubango, melhor ainda. Lá vai chegar dinheiro. No Kuando Kubango não há dinheiro, estás a topar? Já falei.

SA – É possível construir um milhão de casas em um ano, quando nem a metade se ergueu em mais de 30 anos?

JC – Se fosse eu a dizer isso, vocês diriam que eu estava bêbado. E a gente sabe que o Man Zé não é dessas frequências. Então, aqui, tu tens duas saídas: ou ele não topou bem no papel, leu mal ou os tais conselheiros, como a gente muitas vezes diz, deram-lhe um conselho errado nesse aspecto. E tem piada que, agora, lembro-me da tal história das tais 20 casas por dia no Zango, que não se conseguiu. Se marcares 20 casas por dia, 3 vezes 4, igual a 12. Doze mil em não sei quantos dias, parece que é isso. Ena! Não eram um milhão, parece que era uma tonelada. Depois tu fazes lá as contas aí. Portanto, é só para te responder: é melhor tu perguntares isso lá ao Man Zé se é possível. Porque político inventa milagres. ■

Conselho aos gestores públicos: «Roubem menos»

SA – Que soluções proporias para que Luanda melhorasse nos aspectos de saneamento básico, criminalidade, trânsito e outros problemas que a afectam?

JC – Provavelmente, só duas coisas: que os gestores dos dinheiros públicos não fossem tão gatunos como são. Segundo, ter visão para depois de amanhã, não é só para amanhã. O que é que eu quero dizer? Vê uma coisa muito gira que aí está: reabilitaram o Caminho de Ferro de Luanda, que é o tal que nos primórdios, no tempo dos coloniais, ia até Malanje. Tínhamos aqui o ramal que ia para o Kicolo. É a tal conversa, toparam a árvore, não toparam a floresta. Porque se tu tens essa linha férrea de Cacuaco, que sai daqui atrás da Cuca, estava lá, ninguém me vem cá dizer que não, se gastam esse troco ali, epá, tu não imaginas. Porque nós, passe a expressão, não é assim que se diz, mas essa é a minha linguagem aqui na lateral, nós temos uma tonelada de pessoas lá em cima no Panguila, Kifangondo, não sei quê, não sei mais quantos. Aquela turma para vir aqui para a cidade é um bico d’obra, mas tu com uma linha férrea por aí estava o dia ganho.

SA – Um breve diagnóstico sobre os sectores da Saúde e da Educação.

JC – É o que eu digo. Tem de se pedir a quem estiver nessas áreas para não roubarem muito, roubem só um bocado. O resto vai chegar para endireitar. Porque fica imoral ouvires dizer que a fulana morreu porque não tinha aspirina. ■

«Aqui não há oposição»

SA – O que é que achas do desempenho da oposição em Angola?

JC – Acho que aqui não tem oposição, por uma razão muito simples: rádio, televisão e imprensa não estão nas mãos deles, são meios de comunicação públicos. Há dias até estava aqui a teorizar – porque sabes que eu também às vezes viro filósofo, poeta e tal, tenho horas próprias para isso – se esses meios de comunicação são do Governo, ah bem, então talvez valham o que valem. Nos Acordos de Alvor, por exemplo, o braço de ferro foi a comunicação. O outro kota a resmungar «eu quero a rádio» e o outro a dizer «Não, eu é que quero». Por acaso até não falaram de televisão, porque praticamente nasceu ou evoluiu naquele período, porque por sorte estava num estágio embrionário. A rádio já lá estava, porque tinhas o programa para amaciar os pretos, que era «A Voz de Angola» ou que raio era.

SA – Há algum político angolano que te cative?

JC – Aqui dentro de casa, não. Lá fora, aquele gajo do Obama. Como é mulato e aqui estão a dizer que é preto, é negro, epá, também fica complicado se eu falar dele. Mas já que você quer uma opinião, o maior orador que nós já tivemos aqui, isso como agora está liberalizado, as imagens vêm no Bilhete de Identidade, por aí fora, digo-te que, seguramente, o maior orador que tu já tiveste aqui neste país é o Jonas Malheiro Savimbi. Maior orador, porque aí tem muito sacana que não sabe o que é orador e não sabe o que é político e depois vai dizer porque, olha, afinal, aquele gajo só tem amigos na UNITA, quando é mentira.

SA – A expulsão de angolanos dos dois Congos que outras consequências poderá trazer nas relações com esses países?

JC – Tu tens aí a história dum kota que deu uma bofetada no outro e esse problema arrastou-se por muitos anos. Essa metáfora é para te situar nesse caso das expulsões. Se queres uma opinião isenta, eu também não tenho nada a ver com os zairenses. Para começar, os zairenses só me incomodam no facto de estarem a dizer que as crianças são feiticeiras. O resto, comam macaco, comam «nfúmbua», quer lá que se lixem, cada um é como é. Agora, que isso vai entortar vai. Se queres também que reforce essa minha dita sinceridade e equidistância, a questão reside no seguinte: os gajos vêm aqui roubar. Porque se tu entras em casa do outro sem papel e depois estás a sair de lá com alguidar e não sei quantos, chama-se roubo, é o equivalente aos tais diamantes. Muito bem, então, aí a turma do Man Zé tem razão de correr com eles. O problema está aí, na forma como correr com eles. Também há hipocrisia das Nações Unidas ou dos tratados internacionais. Vou só te falar da Convenção de Genebra. Porquê que você vai chamar «criminoso de guerra» a outro gajo que te matou com uma bomba, por exemplo, de gindungo assado? Não vejo piada, porque eu quando vou para lutar contigo, vale tudo. Tem um gajo aí, estava na kapanga, o gajo quase a morrer, gritou «ai dente, ai dente», o outro disse: «não é dente, é «gorpo» [golpe]». Portanto, quando a gente vai para lutar vale tudo. Um matulão que eu não aguento mão a mão, o quê que eu faço? Pego pedra. Dantes era assim que eu aprendi. Agora é que os cobardes estão a ir buscar pistola. Logo, eles que se entendam, ninguém corre ninguém. Os zairenses podem ter o seu bocado de razão, só bocado. Eles excederam-se, eu já olhei aqui para a lateral e eu disse «se eu estivesse no lugar do Man Zé, a essa hora ia sair muita fumaça» e não vale a pena dizer aqui por escrito o que eu pensei.

SA – E como encaras a entrada ilegal de outros estrangeiros no país, em particular de portugueses, muitos dos quais vão trabalhando de forma ilícita, em muitos casos ocupando lugares que seriam de angolanos?

JC – Uma vez queria me meter aí num negócio, o outro indivíduo mandou-me lixar e eu lamentei «então aquele “ngurra” [estrangeiro], ele disse-me «você não dá!». Muito gajo que estás aí a ver tem bilhete, mesmo esse bilhete da concórdia ele já tem. Quê que você vai fazer? Se fosse nos meus tempos, um monte de bicos nesses gajos, mas tu não resolves. É como matar os meliantes. Os outros estão aí a nascer como cogumelos.■

«Foi palavra só para matar»

SA – Até que ponto estiveste envolvido no 27 de Maio de 1977?

JC – Aqui ninguém esteve envolvido. Dou-te só um exemplo: dois dias depois, saiu um comunicado, na primeira página do Jornal de Angola porque o fulano quis matar, o fulano jantou com o sicrano, combinaram assim, assado e cozido. Um dos nomes desses indivíduos que eles dizem que queriam matar o fulano, está aí, é ministro. Ora, isso, em português, chama-se aldrabice, vigarice. O que foi o 27 de Maio? Continuo a dizer que foi um processo de comunistas. Só que entre eles havia os mais sacanas e os menos sacanas. Uns diziam, bem, é preciso pôr este gajo de lado. E foi nessa perspectiva que uns inventaram o fraccionismo e, para piorar, foram chamar os cubanos. Depois, vão dizer que os cubanos não estavam aqui. O artigo 56 da constituição do MPLA diz que é uma congregação de pensamentos e não sei quantos. Isso quer dizer que se tu pensas A e o outro pensa B vamos arranjar o tal máximo ou mínimo denominador comum. Tu hostilizas o outro, matas-lhe e depois dizes que aquele gajo era um filho da… Foi isso que se passou lá. Fraccionismo de quê? Isso é palavra só para matar o outro. Ouve só, vou só te contar uma coisa: o 27 de Maio serviu para muito gajo exorcizar os seus próprios fantasmas. Tem gajos que não fizeram nada a ninguém. Tem um gajo chamado Ginguma, você não sabe, porquê que o mataram? Então, saber jogar bem a bola é crime? Ó lá, não me faça ficar zangado, vai-te fo…

SA – Já se disse tudo sobre essa tragédia?

JC – Não! Tem piada, eu soube – por acaso até ainda nem me encontrei com ele – que o Man Zé era o coordenador da comissão de inquérito e até hoje eu não conheço os resultados desse dito inquérito.

SA – Mas algumas vozes dizem que também o Man Zé esteve envolvido.

JC – Algumas vozes e no inferno tem muitas vozes.

SA – Concorda que se crie uma Comissão da Verdade para exorcizar o problema?

JC – Da verdade ou da mentira, vamos discutir o assunto, mais nada, meu.

SA – O programa radiofónico Kudiganguela, emitido até ao dia 27 de Maio de 1977, de que eras apresentador, tinha uma palavra de ordem, segundo a qual, «No dia em que o Kudibanguela acabar, é porque o fascismo entrou em Angola». Será que esta predição se concretizou?

JC – Aquilo era uma espécie de premonição. A PIDE-DISA andava aí a vasculhar e criámos essa frase, que eu desconfio que continue a ser a mais emblemática até agora, que é: «No dia em que o Kudiganguela acabar é porque o fascismo entrou em Angola». Se tu fizeres contas, sem ramela nas vistas, vais perceber que tem tanto de veracidade como um bilhete... «nonó» [novinho] da Silva.

SA – O Kudibanguela era um programa dos fraccionistas?

JC – Não sei porquê! A base de qualquer programa numa estação emissora é divulgar ideias, entretenimento, uelelé, uelelé, como vocês dizem, etc., etc. Portanto, o que era o Kudibanguela? Era mais um programa de rádio. Vocês não costumam ouvir aí programas dos burros, programa dos espertos, programa dos mais ou menos, até vem lá das misses, não é assim? ■

Turma do Cabelo Mau
O grupo do rock and roll em kimbundu

SA – Mesmo cantando rock em quimbundo, a Turma do Cabelo Mau ou 5ª Sinfonia, grupo de que eras vocalista, conseguiu a proeza de penetrar as elites coloniais, já que as músicas em línguas nacionais eram quase que rejeitadas. Como conseguiram tal feito, superlotando inclusive salas de cinema como o Miramar e o Restauração?

JC – Bem feitas as contas, nós não conseguimos proeza nenhuma. Aprendemos o dito a César o que é de César. Antes de nós, estavam os Negoleiros, os Dikindos, os Kimbambas do Ritmo, que era lá do Man Zé. Agora, no meio desses todos, os que primeiro se introduziram na sociedade colonial daqui foi o Ngola Ritmos. Esse é que, desconfio, podes dizer os puros. Nós éramos uma versão angolana do que era o Ossibisa, o Carlos Santana, o afro-rock. Mas é verdade que o nosso som batia lá! Eu estava lá a cantar o «Ngana Esperança ua ngui ambele não sei quê».

SA – Quem eram os outros integrantes da Turma do Cabelo Mau ou 5ª Sinfonia? Tinham uns nomes muito excêntricos, não?

JC – Nós tínhamos o Arlindo «Dany» (Arlindo Mesquita). Coitado! Faleceu esta semana na África do Sul. Tocava viola ritmo. Tínhamos o «Pick Touchon» (Evaristo Silva, meu irmão mais velho); o falecido «Palhaço», que era o Abuzgnet Dias Palhas, baterista; o «Mister Mbuco», filho do criado Simão, que era da percussão; o «Tombia Mufesta» (João Manuel Tombia) e eu era o «Danis Clidens the Better in the Morning at Home». Houve um período em que «Little John», não o vejo há uma tonelada de anos, substituiu temporariamente o «Palhaço» porque este esteve ausente. Depois, tínhamos a equipa de apoio, em que estava o «Ivanhoé Matos da Fonseca Síboda», que era o gajo que recolhia os dinheiros, e o «John Elonso Santos Holliday».

SA – Vocês consumiam estupefacientes ou a vossa inspiração era natural?

JC – Mas um indivíduo para trabalhar precisa de fumar? Isso aqui não é Maradona! Marca golo com a mão e depois diz que Deus é que mandou, não!

SA – Alguma vez pensaram em reunir- se para gravar um disco como muitos grupos antigos têm estado a fazer?

JC – Aqui próximo à direcção da Movicel tem uma farmácia, por cima da qual existia um estúdio, onde nós estávamos a gravar, em 1971. Mas, depois, a questão do dinheiro inviabilizou. Senão, hoje as pessoas estariam a ouvir as músicas que nós achamos que eram boas e que os nossos fãs gostavam. Não saiu em disco, paciência. Também não vale a pena chorar, mais velho que chora é burro. ■


JC – Eu? Já viste! Isso são manobras do imperialismo. Então vou ter isso, onde é que eu estava a esta hora? Pensas que estaria aqui? Toda hora a dar aí umas curvas. Isso é inveja. E a «Corporation» não é restaurante, não é bar nem é hotel, é uma espécie de parlamento extra. Tu próprio sabes que aqui é o único sítio onde falo mal de todos, mais nada. Falo mal e falo bem, é claro. Aqui é onde me sinto à vontade. Falo mal deste ou daquele, no bom sentido. A mim também me falam mal.

SA – Gabaste de ser o homem mais bem informado do «Lusaka» [Sambizanga]. Explica lá como consegues isso.

JC – Yá, sou. Eu posso ficar estacionado no Cuba e as pessoas encontram-me e me dão as informações. Vêm à minha procura «olha, Man Zuze e tal…».

SA – Tens ou tiveste arma(s) em casa?

JC – Tinha umas «kilunzas» [pistolas] lá no kubico [casa], mas respondi ao apelo do Governo e já as entreguei, apesar de que eram todas legais.

SA – E como é essa estória de teres visto Deus a defecar nas barrocas do Miramar? É verdadeira?

JC – Eu não vou contar mais. Vou só te dizer o seguinte: se fosse um mulato ou um branco a dizerem que viram Deus a cagar, vocês diriam que é verdade. Mas como é um preto fulo como eu, dizem que é mentira. Então fiquem lá nas vossas suposições. Minnesota Yolapamba é a minha testemunha ocular.

SA – Tu e a tua família tratam-se nos hospitais públicos, centros de saúde, nas clínicas privadas ou no estrangeiro?

JC – Então, eu eterno e glorioso Zuze dya Ngana, como também me conhecem aqui e, já agora, ainda como «Doutor Bagre Fumado», acreditas que vou ser tratado nessas Endiamas e companhia? É aqui no Centro de Saúde do Sambizanga.

SA – Mas dizem que volta e meia estás em Portugal, na Namíbia, etc.

JC – É mais uma manobra dos gajos que não me gramam para inviabilizarem que o MPLA me pague o dinheiro que me deve, tás a topar? assim o «works party» [partido do trabalho]. A pensar: «aquele já está lunguta [enriqueceu] e não precisa».

SA – Já pensaste em escrever as tuas memórias?

JC – Não. Porquê? Eu também tenho vontade de chegar à idade daquele gajo que não quer deixar o poder até 87 anos. Então, está a faltar muito tempo, não é?

SA – Como proprietário da «Sarrabulho Corporation», alguma vez já beneficiaste de crédito bancário?

JC – Não, tu mesmo sabes. Eu já vi, tu deves ser um membro da 5ª coluna. Vieste aqui fazer perguntas para me arranjar problemas lá com o outro gajo. Como é que me vão dar crédito? Como? Fala só? Os outros que recebem são filhos do fulano de tal. Eu sou filho da dona Ana e do sô Silva, tás a topar?


SA – Com que Angola é que sonha?

JC – Todos os gajos sonham positivo. Não sou excepção.

SA – Como surge o nome Zuze Dya Ngana?

JC – Eu sou filho da dona Ana, a maior doméstica do país. Se o meu primeiro nome é José e se estiveres a falar com um quimbundo vais-me apresentar «ó yó Zuze dya Ngana». O nome surge na cadeia porque eu estava a disputar a minha sobrevivência contra esses pidescos da DISA que andam por aí e para poder comunicar com o exterior. Foi uma forma de iludir a vigilância dos pidescos, que conheciam o nome Carrasquinha mas não conheciam a pessoa.

SA – Estás filiado em algum partido político?

JC – Sou do Partido Popular da Tábua?

SA – Que partido é esse?

JC – É o meu partido.

SA – Na tua opinião, como é que está o nível da corrupção em Angola?

JC – Ah! Está saudável, está saudável!

SA – Um comentário sobre o trabalho que a administração do Lusaka [Sambizanga] está a realizar e o projecto de requalificação.

JC – Esse administrador foi eleito? Se foi eleito, eu faço um comentário, se não foi, não faço. É melhor falar mal ou bem do dono dele. O projecto de requalificação, por exemplo. Se há alguma razão para eu falar mal do Man Zé, é essa. Ele é do «Lusaka» e devia ter tratado é, é do «Lusaka»! E não tratou porquê? É provável até que tu que estás aí na lateral alegues preocupações a nível nacional. Não é só isso. Se te falar de Kamanyola e ou de Yamoussukro vais dizer porque, porque...

SA – Como estamos em termos de campos para a prática do futebol?

JC – Têm estado aqui a cometer muitos erros e não há espaços para mais nada. Praticamente Luanda não tem campo para os miúdos jogarem a tal bola de trapo. Isso desequilibra. Aqui no município, é só o Campo da Académica. Agora dizem que é Mário Santiago. Ele que fique lá com a paz dele em segurança, se está no Céu ou no inferno, mas o nome daquele campo é da Académica.

SA – É verdade que foi Francisco Simons quem te ajudou sair da cadeia?

JC – Não me salvou da cadeia. Fui apoiado nos meus esforços para sair da cadeia. Eu já estava preso e havia uns pidescos que me queriam matar, mas decorria só da inveja deles. «Quê?! Carrasco, mais conhecido que eu?» O Simons foi um dos que escreveu a meu favor. A maior parte desses gajos que escreveram a pedir que saísse da prisão eram mulatos. Vocês andam a pensar que eu sou racista. Grande parte dos meus amigos são mulatos.

SA – E a tua «loira» também é mulata,não?

JC – Não, vai-te lixar, é uma preta fula como eu. Está bem, os pais dela são mulatos. Tu tens coragem de vir me dizer? Um dia eu vou atacar o teu director para lhe perguntar como é que o Obama é negro. Negro de quê?! Nós, gajos como eu, somos pretos, o Obama é «Iazula», mais nada! É mulato, ó! Está o César Barbosa, um gajo que foi director da Rádio, meu amigo, é um dos madiés que também subscreveu, o Lucrécio, o Mogas, enfim... ■

Fonte: Semanário angolense, edição 343, 21 de novembro de 2009.