terça-feira, 30 de junho de 2009

Há uma pedra no meio do pomar




Os frutos e as pedradas

Tchizé dos Santos in Jornal de Angola

Há pessoas que na incapacidade de plantar as suas próprias árvores, atiram pedras para comer os frutos da árvore do vizinho. Quando atiram as pedras, os frutos caem e os autores das pedradas comem-nos, felizes, porque não tiveram que plantar nem cultivar uma árvore e esperar dois a três anos para colher os frutos.

Percebem que a pedrada é um método fácil e rápido de gratificação e assim andam pela calada da noite, de árvore em árvore a atirar as suas pedras à criatividade alheia e a usufruírem das vitaminas dos frutos dos outros.

Como este é um comportamento típico de pessoas que actuam por instinto e de forma imediatista, os autores das pedradas nem sequer sabem que cada árvore que apedrejam vai produzir novos frutos, provavelmente mais doces e suculentos do que no apedrejamento anterior.

Estas pessoas mal formadas só sabem uma coisa: o seu sucesso depende exclusivamente de atirar pedras às árvores alheias. Às vezes, as mangas ainda estão verdes, mas eles disparam só pelo prazer de atirar as pedras.

Como têm dificuldade em pensar, nunca saberão que ganhavam muito mais se plantassem a sua própria árvore a partir de uma semente, para ao fim de alguns anos colherem os frutos na época própria.

Pelo contrário, preferem continuar a atirar as pedras, por vezes sem direcção. Correm o risco de, por engano, um dia errarem o alvo e partirem os vidros da sua própria casa. Mas correm riscos mais graves: na ânsia de abanarem a árvore do vizinho, podem cair do muro sobre o qual se colocam para atirar as pedradas e esconder a mão.

Enquanto isso, os bons vizinhos que plantaram a primeira árvore, com a sua iniciativa e força de vontade, vão plantar a segunda e a terceira árvore, até terem um pomar de sucesso e reconhecimento, repleto de árvores com suculentos frutos. A maior parte das vezes, os construtores de pomares, focados no seu trabalho e no lado positivo da vida, nem sequer chegam a perceber que alguém esteve a atirar pedras às suas árvores na calada da noite e a comer alguns dos seus belos frutos.


Os frutos e as pedradas de Tchizé

Por Anastácio Ndunduma

Li um texto deveras lindo assinado por Tchizé dos Santos. De um tom marcadamente melancólico, dava a perceber uma menina magoada como quem à oferta do seu amor recebera a rejeição de gente que lhe era querida.

No texto – que possui mesmo alguma poesia – Tchizé falava daqueles que plantam árvores e dos outros que as sacodem para comer os frutos, às vezes ainda verdes; dos que, árvore após árvore chegam até pomares, e daqueles que, em cima dos muros que rodeiam os pomares, atiram pedras para deixar cair frutos que depois apanham. E a alegoria do texto termina com verdadeira chave de ouro: os que plantam os pomares andam tão ocupados nesta nobre tarefa que nem reparam nos poucos frutos que os larápios de cima dos muros vão derrubando com algumas pedradas.

Li e achei o texto digno de uma menina bem comportada que, conhecendo o lugar dos da sua idade, defende o direito de ter também a sua oportunidade de mostrar o que vale. A poesia elegante do texto reflectiria a consciência tranqüila de quem, sabendo o que vale, repreende suavemente quem duvida desse intrínseco valor; a alegoria poética denotaria a elegância de quem repreende com o cuidado de não ferir, de não magoar. Assim me pareceu a intenção do texto da nossa «menina» Tchizé.

O que o lindo texto não falou – ou disse? – é que é bom sim plantar árvores de fruto. Mas isso não pode ser feito em terreno alheio. É nobre sim cultivar pomares; mas eles não podem ser plantados na praça central da aldeia, um espaço que pertence a todos, não de ninguém sozinho. Cada um tem sim direito de pôr muros em volta dos seus pomares; mas os pomares têm que estar em terras do próprio dono, por ele desbravadas, e aí pode pôr os muros que delimitam a propriedade ganha com o seu suor e trabalho.

A alegoria poética, que até é bonita, não diz que a autora desse exercício fez trungungu feio com mais velhos que chamaram-na a atenção. Não houve poesia nenhuma em dizer que ela – uma menina de trinta e um anos – fez mais pela televisão em Angola que qualquer outra pessoa. Já viram?! – diz a voz do povo. Vê-se mesmo que na sua formação acadêmica não estudou a história da comunicação social angolana. Por isso, nem merece comentários. É obvio que nesta disciplina, a badalada «consultora sênior em comunicação social» está irremediavelmente reprovada.

Não houve elegância nenhuma em mentir que Luísa Rogério lhe pedira desculpas baseada numa conversa em que esta procurava explicar que não havia nada de pessoal no que estava a defender. Nem houve candura alguma em ameaçar a Luísa e o SJA, porque esta tinha sido suficientemente coerente para manter as suas posições e também corajosa para enfrentar a ameaça velada da rolha e do bastão.

Digamos que, se logo depois da sua nomeação para a malfadada comissão, Tchizé escrevesse este texto em vez de esbaforar poderes quaisquer, o contexto do texto seria outro, certamente mais favorável. O curso do discurso seria diferente, certamente mais concursivo...

Para remate, o texto poético da nossa «branda» Tchizé chama a todos nós, os formados nesta terra também dela, «mal formados». Kum’assim! Quer então ela dizer que os que não tiveram a sorte de ir estudar lá fora estão mal formados? Quer ela dizer que a educação que uma plêiade de pessoas, com o papá dela à cabeça, estabeleceram neste País, pariu quadros «mal formados»?

Saiba que não. Sou, por acaso, daqueles que não pagaram um tostão pela sua formação da iniciação à décima segunda classe. O Estado pagou tudo: propinas, livros, internato, alimentação. Quando terminei o curso médio – no carismático Tchivinguiro, não tinha a Tchizé sequer dez anos –, era profissional de comunicação rural que, para além de cavar a terra, falava fluentemente Inglês e Francês. E hoje estou aqui, graças a Deus, e um dia que Tchizé queira fazer um mestrado ou doutoramento em comunicação social, talvez ainda venha a ser minha aluna. Sem nunca ter saído desta terra que Deus nos deu, o que não me incomoda, nem a mim nem aos colegas que «se gostam». Nem somos mal formados coisíssima alguma.

Os bem formados são, aliás, aqueles que reconhecem, respeitam e apreciam a formação dos outros, sobretudo se for diferente da sua. Essa seria, se calhar, a primeira lição que eu, Anastácio Ndunnduma, daria assumidamente à «coleguita» Tchizé: a única coisa que sabemos, já dizia Sócrates, é que nada sabemos...

E, assim, estragou-se o efeito da poesia alegórica do texto da Tchizé; o contexto estragou o texto, e o curso o discurso. Se Tchizé, do alto da sua «sabedoria», prestasse mais atenção aos postulados da Sociologia da Comunicação – que não me digam que não estudou nas altas universidades... de fora onde passou – quem sabe faria dos seus textos intencionalmente poéticos, algo mais... tragável.

Fonte: SA

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