quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Miala é jóio ou trigo? (II)

Finalmente, a sentença saiu. Eu prometi, na primeira parte, que iria discutir as acusações que pesavam sobre Miala. Infelizmente, não foi possível. Andei muito ocupado. Precisei terminar um trabalho que era mais importante. Mas também o processo não deu em nada... Eu já sabia disso. Fez-se tanta lambança, mobilizaram um exército, tanta tempestade num tubinho de canudo que até um simples mosquito conseguiria sobreviver. A isso, Sérgio Mota, com toda propriedade, chamou de “masturbação sociológica”.

É impressionante os labirintos do processo. Labirintos cheios de baratas. Da acusação da tentativa de golpe de Estado, com a morte do presidente, passou por furtos e roubos (dos quais misteriosamente foram absolvidos) e foi parar na “insubordinação”. Se o processo de prolongasse mais, talvez fosse condenado por ser angolano. Prender alguém que não representa perigo para a sociedade, que possui residência fixa, que prestou grandes serviços para o sistema, que deu lição de como gerir os fundos públicos, e poucos aprenderam... Ele foi uma laranja. Depois de sugarem aquilo que precisavam, foi jogado à sua sorte. O sistema que temos não demite incompetentes, nem são maltratados, muito menos convocados para a exoneração pública. É um sistema muito ingrato, muito cruel. Não sei se a idéia é passar ao mundo que a justiça angolana agora começou a funcionar, ou que o país agora pune os corruptos (que não seria o caso), se for, começou de maneira e pelo lado errado.

Aliás, chego a pensar: se todo cidadão fosse condenado a quatro anos, por insubordinação, se isso fosse levado a sério, não haveria presídios, no país, para acolher a tantos insubordinados. Insubordinação contra a democracia ao persistirem no adiamento da data das eleições por três vezes: quatro anos. Já são trinta insubordinações pela não aceitação de transparência das contas de petróleo: 40 anos. Insubordinação da imprensa estatal por insistir em não transmitir eventos da oposição: quatros anos. Insubordinação por não investirem na educação, habitação, saúde, transporte: 400 anos; insubordinação por serem avessos às mudanças; são sempre as mesmas caras no governo, mesmo que as estrelas e aviões caiam ou que se viva numa época em que as cobras fumem; insubordinação da Televisão em insistir na exibição de programas como telenovela, que é responsável pela catastrófica degradação moral da população, enfim.

Para mim, quatro anos é muito pouco para aquele que cometeu tantos crimes, conforme previa a acusação, e é muito para o cidadão que, depois de tanta humilhação, preferiu ficar no conforto do lar a enfrentar um transito infernal. Nesse processo, deveriam aplicar a lei dos Simpsons: ou ser o primeiro ou ser o último, porque ser o segundo ou último é tudo mesma coisa.

Hoje quero falar mesmo é do Direito. Não adianta mais analisar esta ou aquela acusação, porque poderíamos descobrir, por exemplo, que quando o presidente se ausenta do país é prenúncio da explosão de uma bomba. Não mais adianta saber se Miala fez parte do sistema ou não, se contribuiu para a miséria que aí está ou não, se é bakongo ou não, se é angolano genuíno ou não.

Se olharmos para o passado, podemos encontrar vários casos de pessoas que sofreram com anuência de estados legitimados pelo Direito. Estados de Direito que eram governados por representantes legitimados pelo voto, mas que não eram democráticos. É lamentável que no alvorecer do século XXI ainda precisemos abordar as conseqüências da não observação dos princípios garantidores da cidadania. Marx já dizia “a história se repete como farsa”. Fica evidente aqui o grau de civilidade e o preço que é pago quando falta a cultura democrática; quando, por exemplo, o anúncio da data de eleição é um troféu de estimação que precisa ser guardado às sete chaves.

A democracia, que tanto pregamos, traz mudanças também na ordem jurídica, no que se refere à igualdade, que deixa de ser formal e passa a significar o direito da real igualdade de oportunidades, à participação e à liberdade. A sociedade regida pelo estado democrático de direito proporciona aos seus cidadãos uma idéia mais clara de seus direitos. Lamento afirmar que, ainda, precisaremos caminhar muito.

Precisamos construir a credibilidade da justiça. Se Angola quiser se firmar como uma grande nação, os operadores do direito devem abandonar o sistema do ponto de vista dos produtores do serviço processual, deslocar o ponto de vista, passando a ver o processo a partir de um ângulo externo, ou seja, examiná-lo nos seus resultados práticos sem descuidar da observância de garantias jurídicas mínimas. Precisamos uma nova postura e mentalidade voltada aos novos valores da dinâmica social. A justiça não deve ser “secreta” nem se ajuelhar, para pedir bençãos ou o "jabaculé" a nenhum poder. Deve parar de “remar contra a maré”. Precisamos nos preocupar cada vez mais com uma justiça para todos.

Desse processo, é incontestável que Miala e o povo amante da democracia saíram fortalecidos. O portal club-k.net deu um banho de cobertura nos concorrentes. Os pilotos desse processo não devem mais repetir a história. Que seja indenizado todo aquele que sofreu dano de ordem material ou imateral. Se Miala, em algum momento de sua vida cometeu alguns equívocos que seja perdoado (que santos atirem a primeira pedra). Se aconteceu, isso, muitas vezes, pode ser à obediência aos efeitos das correntezas do “el ninõ”. Se confirmaria, nesse caso, a máxima: “diga-me em que partido andas e eu te direi quem és”. Não é fácil ser trigo no meio do jóio. Jogo desempatado. Por favor, Ziu, patrono da justiça, inspire os pilotos do processo para que crucifiquem baratas e soltem Miala. (Miala, amigo, o povo está contigo; É o que mosta a enquete que está sendo realizada pelo club-k.net).

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