Povo angolano:
Ao longo da história do nosso país, o conceito de
paz esteve sempre associado à ausência de guerra. O calendário nacional
consagrou como “Dia da Paz”, o dia em que os militares assinalaram o calar das
armas por via de um Acordo de papel.
Assim, quando se fala de paz, muitos pensam
apenas na dimensão militar da última fase do conflito socio-político que
assolou Angola por décadas.
Todavia, esta não é paz que a humanidade almeja e
os angolanos merecem. A Organização das Nacões Unidas Para a Educação, Ciência
e Cultura, inseriu no preâmbulo do seu Acto Constitutivo, as seguintes palavras
sobre a paz:
"Uma vez que
as guerras começam na mente dos homens, é na mente dos homens que as defesas da
paz devem ser construídas".
De facto, se não são as armas que causam as
guerras, mas sim a mente dos homens, suas ambições, orgulhos e paixões, também
a paz não se defende calando as armas nem assinando acordos de papel para se
calarem as armas.
A paz, tal como a
democracia, é uma cultura, é um modo de estar. A paz é fruto da democracia, e a
democracia é o regime político da paz.
A Cultura da Paz, consagrada após a II Segunda
Guerra Mundial, está intrinsecamente ligada ao respeito pelos direitos
universais do homem e à defesa da dignidade humana. É uma cultura baseada na
tolerância, na igualdade e na solidariedade.
É uma Cultura que se empenha em prevenir
conflitos resolvendo-os em suas fontes. Estes conflitos incluem as novas
ameaças não-militares para a paz e para a segurança, como a exclusão, a pobreza
extrema, a corrupção institucional e a degradação ambiental.
A Cultura de Paz procura resolver estes novos
conflitos logo que eles se manifestam, por meio do diálogo, da negociação e da
mediação, de forma a tornar a violência desnecessária e inviável.
Em matéria de
cultura da paz, conforme ela é entendida pela UNESCO, onze anos depois das
armas se terem calado em Angola, onde estamos? O que é que temos?
Construímos estradas, prédios e centralidades,
mas não construímos, nas mentes e nos espíritos das pessoas, as defesas da paz!
Temos leis no papel, que consagram os valores e a
cultura da paz. Ouvimos nas televisões e na Rádio, um discurso oficial
aparentemente moralizador, apelando ao diálogo. Mas na prática, temos a
intolerância, a exclusão, as gritantes desigualdades, a impunidade e as
constantes agressões à Constituição e à Lei.
O diálogo que constrói a paz, é o diálogo entre
pessoas que pensam de maneira diferente, é o diálogo entre governo e oposição,
ricos e pobres, diálogo entre adversários. Os amigos não estão em conflito.
• Se a televisão e a Rádio, ao convidar analistas
para comentar acontecimentos políticos ou sociais, convidar pessoas de um só
Partido ou que pensam todos da mesma maneira, não está a promover o diálogo que
produz a paz, porque entre estes não há diferenças, não há ideias
conflituantes.
• Se temos medo de dialogar com quem pensa
diferente de nós, então não estamos em paz e temos medo da paz!
• Se temos medo de explicar ao nosso compatriota
como obtivemos as riquezas que exibimos de dia para noite, então, não estamos
em paz e temos medo da paz!
• Se temos medo que o nosso irmão tenha acesso
livre e igual à Rádio Nacional de Angola, para dizer livremente o que lhe vai
na alma ou para criticar, então não estamos em paz e temos medo da paz!
• Se pregamos a justiça e a solidariedade e vemos o
nosso irmão ir levar água, mantimentos e conforto a quem perdeu seus haveres,
lá no Cacuaco ou no Lubango, e mandamos lá a Polícia para o impedir, porque
temos medo que ele fale com o povo sobre os seus problemas, então não estamos
em paz e temos medo da paz!
• Se pregamos que ninguém está acima da lei e
ouvimos acusações graves de violação da lei, mas temos medo de as investigar,
mesmo sabendo que a Constituição nos manda investigar, e arquivamos a queixa,
porque nos sentimos pequenos demais, então não estamos em paz e temos medo da
paz!
Não estamos em
paz, porque a paz é obra da justiça, obra da tolerância e do respeito mútuo. E
nós, detentores do poder, praticamos a injustiça, a intolerância e
desreipeitamos o próximo!
Respeitar o próximo como queremos que nos
respeitem, sobretudo aqueles dos quais discordamos, expressa o sentimento de
tolerância, indispensável para a harmonia social.
Temos medo da
paz, porque a paz é obra da liberdade. E nós, detentores do poder, infringimos
os direitos e as liberdades das maiorias.
Só a liberdade, protegida pelas leis e garantida
nos direitos individuais inscritos na Constituição, afasta o medo, desfaz as
desconfianças, elimina os ressentimentos e estimula a cooperação, a solidariedade
e o apoio mútuo.
Quem defrauda a lei e apropria-se do património
público sem pudor nem temor, não vive em liberdade, vive com medo, até dos seus
próprios guardas!
A cultura da paz,
tal como definida pela UNESCO, também foi consagrada na Constituição Angolana. O artigo 11.º da CRA,
dispõe que “a paz tem como base o primado do direito e da lei...” “ A segurança nacional é baseada no primado
do direito e da lei...”
Isto significa que a paz constitucional não é a
paz de Abril. A paz constitucional é a paz resultante do cumprimento da Lei por
todos. É a paz do respeito pelos direitos humanos; é a paz da verdade eleitoral
e do respeito pela probidade pública.
Não há paz, lá onde a corrupção e a impunidade
estão ancoradas nas instituições do Estado. Não há paz lá onde o Estado agride
o cidadão, não explica o desaparecimento de cidadãos; não investiga indícios de
crimes; e transmite a ideia de que existem pessoas acima da Lei.
Não há paz, lá onde as pessoas vivem
permanentemente a pensar na guerra do passado. Confundem o exercício legítimo
do direito democrático de oposição com o espectro da guerra e utilizam o
espectro da guerra para violar a lei e estabelecer, de facto, o Estado de
não-Direito!
Onze anos depois
de assinada a paz militar, o que vemos relativamente à paz constitucional, que
é a paz que se baseia no primado do direito e da lei?
• Vemos titulares
de cargos públicos a transformarem as instituições públicas em verdadeiras
coutadas particulares, sem pudor nem temor.
• Vemos o Poder
Judicial transformado num mero apêndice do poder político, salvo as devidas e
honrosas excepções.
• Vemos, ao nível
da sociedade, em particular no seio da juventude, a propagação do discurso
obsceno e violento e a promoção de falsos valores como o poder a qualquer custo,
o prazer a qualquer momento e a ostentação, sintomas evidentes da ausência da
cultura de paz.
• Vemos, acima de
tudo, a violação sistemática da lei por quem a devia proteger e a promoção
institucional da injustiça social, da exclusão, da acumulação ilegal de riqueza
e da corrupção, por quem as devia repudiar, combater e punir.
Minhas senhoras e
meus senhores:
Agora incumbe-nos
estabelecer os fundamentos para vivermos a paz. E estes fundamentos são:
• a
verdadeira democracia representativa,
• o
Estado de direito, • a garantia dos direitos e liberdades individuais; e
• a soberania popular.
Povo angolano,
- Não há saída para os impasses de Angola, não há solução para os seus graves problemas sociais, não há futuro digno para os seus filhos, a não ser na democracia.
- O sucesso de Angola como nação, depende de nossa coragem e patriotismo para nos reencontrarmos como irmãos, na construção de uma autêntica democracia, de uma sociedade aberta e pluralista e de um desenvolvimento descentralizado a partir do Poder Local.
- O reencontro da família angolana exige um diálogo estruturado e abrangente, sem pré-condições, entre os adversários de ontem.
• A UNITA está
preparada e disponível para iniciar esse diálogo.
• Somente a
experiência de uma prática política democrática, terá o poder de completar a
obra inconclusa da construção da nação, da constituição de uma sociedade civil
forte e autónoma e da própria consolidação da democracia.
• A UNITA reafirma,
por meu intermédio, para todo o povo angolano, o seu compromisso irreversível e
incondicional com a paz, a sua rejeição absoluta à luta armada e à violência
política como formas de competir pelo poder, e a sua igualmente absoluta
fidelidade às regras democráticas universalmente aceites e praticadas.
• A UNITA reafirma,
igualmente, o seu compromisso irreversível e incondicional para com a causa do
povo e a sua determinação de congregar os angolanos para a mudança, visando a
construção da paz, da democracia e da prosperidade para todos.
• Nesta data
histórica, A UNITA rende homenagem aos obreiros da independência nacional, aos
obreiros da Liberdade e da Democracia em Angola; louva a contribuição das
Igrejas e de todas as organizações da sociedade civil que têm desempenhado um
papel fundamental através das suas homilias e acções cívicas de solidariedade e
de encorajamento para se prosseguir com o processo de aprofundamento da
democracia e consolidação da Paz.